São Paulo, quarta-feira, 08 de maio de 2002

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CARLOS HEITOR CONY

Assunto requentado

RIO DE JANEIRO - Ao tempo em que corriam propinas sobre a venda das estatais, FHC cunhou um bordão, chamando de "nhenhenhém" o que se dizia a propósito do primeiro escalão do governo. Agora, com as revelações de um ministro de Estado ligadíssimo ao reinado tucano, corroboradas por um ex-ministro que chegou a despontar como eminência parda do regime, FHC ressuscita outro bordão, na base do diz-que-diz. Para ele, qualquer suspeita ou acusação contra a probidade de seu primeiro escalão -e às vezes contra a sua probidade- são mexericos de comadres que nada têm a fazer, são latidos de cães raivosos.
Não sou curtidor de detalhes de quanto e como as propinas rolaram durante as privatizações. O noticiário geral cuida disso e, apesar de um ou outro exagero, o sentido factual é verdadeiro.
Prefiro pastar -e como é triste pastar!- no conteúdo, no conceitual da corrupção instalada sobretudo no primeiro mandato de FHC, que tantas vítimas provocou sem contudo chegar ao eixo do poder -que é o próprio presidente da República.
Nenhuma suspeita quanto à honestidade pessoal de FHC, homem que curte o poder, e não o dinheiro. Mas, para chegar e se manter no poder, ele foi obrigado a campanhas explícitas e implícitas que custaram um dinheirão que ele não tinha -porque, repito, é homem honesto, cujo projeto de vida nunca foi o enriquecimento lícito e, muito menos, o ilícito.
A figura do atual PC Farias, que arrecadava fundos para as campanhas de Serra e do próprio FHC, pouco importa. Alguém tem de se prestar ao papel de tesoureiro de uma campanha. O escândalo não está na arrecadação, prevista na lei eleitoral, mas nas chamadas "sobras". Por conta dessas sobras, foi montado um dossiê hoje tido como falso, o Cayman.
Se acaso surgirem fatos novos que reabram a questão, FHC já tem a resposta pronta: é um diz-que-diz, um nhenhenhém, assunto requentado.



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