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FERNANDO DE BARROS E SILVA
Maria Amélia
SÃO PAULO - Maria Amélia conta
que conheceu Sérgio Buarque de
Holanda na sede do Jockey Club do
Rio, numa noite de Carnaval de
1934. O entrevistador então lhe
pergunta: "Mas e a história do namoro, do noivado?". E ela, sorridente: "Essas coisas não têm história.
Aconteceram. Só".
A cena, de um despojamento que
desconcerta e emociona, está logo
no início do documentário "Raízes
do Brasil: uma cinebiografia de Sérgio Buarque de Holanda", dirigido
por Nelson Pereira dos Santos. O
filme foi lançado em 2003, 21 anos
depois da morte do historiador.
O registro é bem "caseiro", quase
amador. Nelson Pereira filma como
alguém "da família". O resultado fica entre o desprendimento total e a
reverência cheia de humor pelo
personagem. Há muito zelo, mas
nenhuma solenidade nos depoimentos. E em tudo sobra afeto.
Não há história, as coisas apenas
"aconteceram". Quase como convidados secretos, somos colocados
diante do que o Brasil tem de melhor, de mais singelo.
É comovente rever o filme agora,
após a morte de Memélia, como é
conhecida a mãe de Chico Buarque.
Ao falar dela, o compositor Paulo
Vanzolini destaca a mistura de "dureza" e "doçura" da sua personalidade e diz que "a maior prova de inteligência que Serjão deu foi ter casado com Maria Amélia".
Apesar de nascer em berço tradicional (Cesário Alvim) e se manter
católica, Memélia se refere com orgulho ao ambiente "anticonvencional" da família que construiu. Diz
que na sua casa ninguém dava valor
a certas coisas, como "ser grã-fino".
Já no finalzinho da sua vida, Sérgio Buarque comentou com a mulher que seria muito bom se pudesse fazer uma história do Brasil contada não a partir do ponto de vista
dos governantes e dos dirigentes,
mas dos governados e dos pobres.
"O Brasil fotografado de baixo para
cima, de dentro para fora", ela explica. E arremata: "Ele não teve
tempo, mas seria uma beleza, também acho. Vocês não acham?".
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