São Paulo, sábado, 08 de junho de 2002

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CARLOS HEITOR CONY

A ética auto-sustentável

RIO DE JANEIRO - Recebi de Evandro Lins e Silva, além do diploma de acadêmico, o conselho para providenciar maiores estantes na minha casa e no meu escritório. Pensei que fosse uma brincadeira cordial de um grande amigo, mas o tempo deu razão ao meu querido mestre.
Em pouco mais de dois anos de usufruto da problemática imortalidade acadêmica, recebi mais livros que em todos os anos de minha mortal existência. É uma invasão. Diariamente, os porteiros do prédio aparecem esbaforidos à minha porta com sacolas e volumes os mais disparatados.
Evidente que recebo com prazer os livros de amigos ou de pessoas que sinceramente admiro. Não são eles, porém, que me causam problemas. Para ficar num caso isolado: atravessei toda uma vida sem nunca me preocupar com o que agora chamam de desenvolvimento auto-sustentável. De uns tempos para cá, comecei a receber uma vastíssima bibliografia sobre tema tão palpitante.
De início, destinei uma fileira de uma das minhas estantes para abrigar tão substanciosos compêndios. Logo, eles ocupavam a estante inteira e me obrigavam a fazer radicais aumentos em casa e no escritório. Estamos chegando ao meio do ano e já penso num projeto de expansão que me custará os olhos da cara: alugar uma fábrica desativada e nela colocar todos os livros, folhetos, folders, releases e apostilas sobre o desenvolvimento auto-sustentável.
Quem vai acabar perdendo a sua condição de auto-sustentável sou eu mesmo. Tenho gasto os tubos com essa brincadeira. Outro tema que muito me persegue em livros, relatórios, pesquisas, seminários e memorandos é o da ética nas relações políticas, jornalísticas e esportivas.
Essa é uma invasão que me chega também pela internet: metade dos e-mails recebidos me perguntam se eu acho a ética necessária nas relações humanas. Somando uma coisa com a outra, acredito que a ética, se não é, deveria ser auto-sustentável. Ignoro o que seja isso, mas seja o que for, terei de alugar o Maracanã para abrigar tudo o que eu não preciso saber sobre o assunto.


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