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RUY CASTRO
A década que não existiu
RIO DE JANEIRO - Tenho uma
tese de difícil defesa e baixa possibilidade de aceitação, que só revelo
aos mais chegados quando eles prometem não rir: a de que os míticos
anos 60, que apaixonam todo mundo- tanto os que os viveram como
os que só os conheceram de livro,
disco ou filme-, não existiram.
Com isso quero dizer que, até
1965, ainda não tínhamos saído
completamente dos anos 50. E, a
partir de 1966, já estávamos nos
anos 70 e não sabíamos. Donde os
anos 60 não existiram. Tudo bem, é
um enunciado ousado, talvez antipático. Mas, somente para argumentar, eis alguns dos motivos que
me levaram a tal conclusão.
Até 1965, os homens ainda usavam terno e gravata. Cuidavam para não desfazer o vinco da calça e
aplicavam Glostora ao topete. Os
rapazes dobravam as manguinhas
da camisa-esporte ao estilo James
Dean. As mulheres usavam anáguas, armavam o cabelo com Bombril e só saíam à rua de frasqueira.
Ainda não havia a pílula, donde os
casais tinham de se virar para fazer
amor. Fumava-se Hollywood e se
tomava Old Parr. Tudo como nos
anos 50. E, como nestes, lia-se Sartre, Faulkner e Giselle Monfort.
A partir de 1966, tudo acima foi
abandonado, exceto Sartre, premiado com alguma sobrevida. Os
homens aderiram aos jeans, às camisas coloridas e às calças justas e
sem bolso. Muitos nunca mais foram ao barbeiro. As mulheres converteram-se à minissaia, passaram
para a maxissaia e acabaram na midissaia. Veio a pílula e nos locupletamos todos. Fumava-se maconha e
se tomava LSD. Como nos anos 70.
E, como nestes, já se lia Marcuse,
McLuhan e Mao Tse-tung.
Ou seja, sobrou pouco que se pudesse considerar exclusivo dos anos
60. Godard. Barbarella. Twiggy. Ravi Shankar. Geraldo Vandré. Leno
& Lílian. Vladimir Palmeira. Ted
Boy Marino. Topo Gigio.
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