São Paulo, quinta-feira, 08 de julho de 2004

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SHARON E A PAZ

O primeiro-ministro de Israel, Ariel Sharon, o general de linha dura envolvido em massacres de palestinos, ideólogo dos assentamentos judaicos nos territórios ocupados, que até há pouco era o incontestável campeão dos conservadores, agora recebe ameaças de morte da direita. O Shin Bet, o serviço secreto interno de Israel, revelou-se preocupado com o aumento das atividades de grupos extremistas religiosos que se opõem a Sharon. Definitivamente, alguma coisa mudou em Israel.
Não há muita dúvida de que a principal alteração foi a proposta do primeiro-ministro de, contrariando toda a sua pregação passada, promover a retirada total dos assentamentos de Gaza. Sharon submeteu esse projeto a um plebiscito interno de seu partido, o Likud. Perdeu. Mas, como o plano conta com o apoio da maioria dos israelenses, o premiê como que ignorou os resultados do referendo. Demitiu dois ministros de partidos mais radicais que pertenciam à coalizão de governo e fez aprovar uma versão do plano de retirada unilateral no gabinete. O Partido Trabalhista, que fazia oposição à sua administração, é favorável à proposta, o que funciona como uma garantia de governabilidade.
Antes de considerar, porém, que Sharon se tenha tornado um defensor do entendimento, cabe lembrar que o premiê isolou completamente o presidente da Autoridade Nacional Palestina. Hoje, Iasser Arafat, também envolvido em ataques contra civis, vive em situação análoga à de prisão domiciliar em Ramallah. Sharon também pretende transformar alguns assentamentos na Cisjordânia em território israelense.
Paralelamente, o premiê lançou forte repressão contra os grupos terroristas palestinos, que parece ter desarticulado momentaneamente a capacidade operacional das células radicais. Os atentados em território israelense diminuíram em quantidade e magnitude. É ilusório, porém, acreditar que Israel esteja conseguindo vencer o terrorismo. O mais provável é que a atual calma seja transitória.
Sem querer negar a importância de passos como a retirada de Gaza, para que se possa vislumbrar uma chance para a paz no conflito israelo-palestino, ainda falta o principal, que é estabelecer uma saída política. É preciso que o unilateralismo (em alguns aspectos até positivo) de Sharon ceda espaço para uma solução negociada, ou será uma questão de tempo até que o desespero dos palestinos se faça mais uma vez traduzir na forma de uma onda de ataques terroristas contra alvos civis.
Gostem ou não Sharon e os israelenses, nenhuma trégua será duradoura o bastante no Oriente Médio se não for fruto de um entendimento entre as partes em conflito.


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