São Paulo, sexta-feira, 08 de outubro de 2010

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RUY CASTRO

Catita e marota

RIO DE JANEIRO - No domingo, uma linda senhorinha de 90 anos, na sala de votação, me falava de sua experiência eleitoral. Embora seja das poucas brasileiras de sua geração ainda a votar, esta será a primeira vez que, sem contar reeleições, verá um presidente eleito pelo voto direto receber a faixa de alguém que a recebeu de seu antecessor nas mesmas condições. Se isto já aconteceu antes no Brasil, não foi no seu tempo.
Como tem hoje 90 anos, nasceu em 1920 e se tornou eleitora em 1938. Mas, em 1937, Getulio Vargas já dera o golpe que criara o Estado Novo. Donde ela só iria votar pela primeira vez em 1946. E, desde então, devido a suicídio, renúncia, ditadura e impeachment, nenhum de nossos presidentes eleitos -Dutra, Getulio, Juscelino, Jânio e Collor- protagonizara tal sequência. O que só se dará agora: o vencedor de 2010 será enfaixado por Lula, que já o fora por FHC.
Para que não se diga que tal oscilação é apenas brasileira, fosse a senhorinha cidadã americana e, no seu tempo de eleitora, também só teria visto esta sequência acontecer a partir de Jimmy Carter, em 1976. Até então, desde 1932, com Franklin Roosevelt, Harry Truman, Dwight Eisenhower, John Kennedy, Lyndon Johnson e Richard Nixon, a sucessão americana foi sempre interrompida por morte natural, assassinato ou impeachment de alguns deles.
Embora também ache que só se aprende a votar votando, minha nova amiga sugeriu que deveria haver uma emenda a esta máxima dizendo: "Nem sempre -ou os EUA não teriam eleito (e reeleito) George W. Bush". Mas, acrescentou, até quem passou a vida votando pode votar errado um dia.
Arrisquei perguntar-lhe, baixinho, em quem votara. E, a provar que, às vezes, o voto tem razões que só a emoção reconhece, ela piscou, catita e marota: "No Plínio. Gostei do velhinho".


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