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ELIANE CANTANHÊDE
Um pé cá, outro lá
BRASÍLIA - "O que te faz avançar é
que ora você anda com o pé direito,
ora com o pé esquerdo. Os movimentos se completam."
A metáfora do ministro da Defesa,
embaixador José Viegas, ilustra bem
o início de governo. E ele entende
bem disso. Serviu em Havana nos
anos 80 e veio direto da Embaixada
de Moscou para o atual cargo.
Exemplo perfeito do que ele disse é
a decisão de Lula de ir, no fim deste
mês, tanto ao Fórum Econômico de
Davos quanto ao Fórum Social de
Porto Alegre. Os "xiitas" consideram
heresia de um presidente de esquerda. Os "xaatos", no linguajar de alguns, diriam que é acender uma vela
para Deus e outra para o diabo.
Davos é a reunião dos poderosos do
mundo todo, gente engravatada, liberal. Digamos que é a reunião da
globalização e do superávit fiscal.
Porto Alegre é a reação de esquerda a
tudo isso, com barbudos, minorias,
acadêmicos -e petistas, claro.
Quem vai a Davos não vai a Porto
Alegre, e quem vai a Porto Alegre não
vai a Davos. Quer dizer: não ia, porque agora vai. A estréia foi há pouco,
no Rio, quando Aloizio Mercadante e
Marta Suplicy foram as estrelas da
Cúpula de Negócios da América Latina, vinculada a Davos.
Apesar das críticas, que já chovem
de todos os lados, Lula não tem alternativa senão ir aos dois. Por quê?
Porque essa é a essência do seu governo. Ao mesmo tempo em que faz um
discurso conservador e cuidadoso a
la Davos na economia, botou todos
os ministros para falar da prioridade
social. Consegue, assim, conquistar a
confiança do mercado (e baixar o dólar, por exemplo) e manter a expectativa do PT e da esquerda.
O equilíbrio entre tudo isso é fundamental para avançar, mas não é
simples. Esquerda e direita, Davos e
Porto Alegre, Henrique Meirelles e
Marina Silva. Como nos ensina o embaixador Viegas, do alto de 60 anos
de idade e uma história de esquerda,
o importante é manter o movimento
entre os dois pés. Qualquer descuido,
um tropeço. Quando o tropeço é forte,
o tombo é certo.
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