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O PAPEL DO E-LIVRO
"Timeo hominem unius libri". "Temo o homem de um só livro", afirmou santo Tomás de Aquino. Um livro só, porém, poderá ser o futuro do
mercado editorial com o e-livro, o livro eletrônico, como mostra o caderno Mais! de hoje.
Na verdade, o e-livro não é bem um
livro. É um pequeno computador
concebido ergonomicamente para a
leitura no qual se descarregam os arquivos das obras que se deseja ler. A
capacidade de armazenamento varia,
indo de 4.000 a 500 mil páginas. Alguns dos sistemas, para proteger direitos autorais, utilizam um formato
que só pode ser lido no aparelho de e-livro e não permite a impressão ou
cópias. É claro que não é preciso ser
adivinho para imaginar que logo surgirão softwares desenhados especificamente para possibilitar a estampagem e as reproduções.
Como com tudo o que surge, a
questão do e-livro vem sendo mal colocada. Parece tratar-se de uma batalha entre o novo e o velho, em que
apenas um deles sobreviverá. Não é
bem assim. Há vantagens e desvantagens nas duas tecnologias e talvez
não seja temerário afirmar que o livro
como o conhecemos ainda durará
bastante.
Por uma razão ainda obscura, as
pessoas gostam de seus livros. Para
além do conteúdo, importam a edição, o cheiro das páginas, a possibilidade de colecionar as obras em bibliotecas; existe, enfim, uma relação
com o objeto físico. Muitos, principalmente as gerações mais velhas,
também consideram pouco confortável ler na tela do computador.
De toda forma, o e-livro, ao menos
em algumas de suas concepções, já é
uma realidade. Obras de referência
principalmente encontram grande
demanda em formatos eletrônicos.
Por mais tentador que seja possuir
uma "Encyclopaedia Britannica" encadernada em couro, é mais prático e
barato substituir os 32 volumes da
edição impressa por um único CD.
Apesar de alguns riscos -como
acabar a bateria nas páginas finais
daquele romance policial-, o e-livro
oferece uma série de pequenas vantagens que merecem consideração. Para o viajante é infinitamente mais cômodo enfiar os 12 títulos que pretende ler nas férias numa maquininha
de 650 gramas do que carregar cerca
de 10 quilos na mala. Também pode
significar a diferença entre o divórcio
e a união feliz para aqueles casais em
que um gosta de ler até tarde. Com a
tela luminosa, pode fazê-lo no escuro, sem incomodar o outro.
A questão fica mais complicada
quando se analisa o mercado editorial propriamente dito. Com o e-livro,
no limite, eliminam-se os editores.
Quase sem custos, qualquer autor
pode colocar seus títulos diretamente
numa livraria virtual. É uma nova era
na liberdade de expressão, que já não
esbarra tanto em limitações econômicas. É evidente que há um preço a
pagar: se já se escreveu e editou muito
lixo ao longo da história, a quantidade de detritos literários tende agora a
crescer exponencialmente.
Se Tomás de Aquino temia o homem de um só livro, há razões de sobra para também temer o homem de
muitos livros equivocados. Como,
porém, não se podem -nem é desejável- estabelecer juízes para decidir
o que é bom ou ruim, que se aproveite a nova democracia literária.
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