São Paulo, segunda-feira, 09 de junho de 2008

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RUY CASTRO

Tapando o nariz

RIO DE JANEIRO - No tempo do "milagre", nos anos 70, o ditador Garrastazu Médici, falando à imprensa estrangeira, escorregou e disse uma frase que ficaria célebre: "O Brasil vai bem, mas o povo vai mal". Sem querer, admitia que os índices de crescimento do país, tidos como espetaculares, não se refletiam nas condições de vida diária do brasileiro, que continuava roendo beira de penico.
Hoje é o contrário. O brasileiro vive um inédito carnaval consumista. Há dinheiro e crédito para tudo: casa própria, carro blindado, TV de plasma, notebook, iPod, depilação a laser, tomate seco, mozarela de búfala, Viagra, Prozac, Lexotan. Qualquer colchete ou retrós pode ser pago em seis vezes -já vi gente comprando um jornal em Congonhas (R$ 2,50) e pagando com cartão de crédito. Todos os índices falam do aumento do poder de fogo do brasileiro diante de um rack, gôndola ou prateleira.
Já o Brasil cambaleia e aderna em outros índices. A Amazônia precisa ser protegida da cobiça dos gringos para continuar sendo derrubada por nós mesmos, à razão de sete campos de futebol por minuto. Instauram-se incontáveis CPIs, apenas para vê-las arquivadas em menos de um ano, para que um ex-governo não possa puxar o rabo do atual e vice-versa. Desmascara-se um chefe de quadrilha e descobre-se que ele era o mesmo chefe da polícia, e que o chefe de ambos era o próprio chefe do governo.
Todo dia vazam denúncias de armações, maracutaias, tráfico de influência, desvio de recursos públicos e compra pura e simples de governos, envolvendo multinacionais, ONGs e todos os níveis de administração -denúncias essas que só têm como resposta a arrogância ou o cinismo.
Os intestinos da maioria das instituições fedem. O povo tapa o nariz e vai às compras.


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