São Paulo, terça-feira, 09 de julho de 2002

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TRATAMENTO OU PENA

Uma forma interessante de abordar a questão das drogas é perguntar se a humanidade um dia conseguirá livrar-se desse problema. Se a resposta for não, como sugerem as evidências, parece despropositado persistir nas estratégias que enfatizam a repressão e tentar promover a abstinência universal.
Como observou o juiz Wálter Fanganiello Maierovitch, ex-secretário nacional antidrogas, em artigo para esta Folha, todas as políticas tradicionais para impedir a difusão das drogas vêm falhando há 40 anos.
Nos últimos anos, verifica-se que, enquanto os EUA insistem nas abordagens repressivas, países da Europa ocidental vêm apostando no conceito de redução de danos. Em vez de tentar impedir a todo custo os usuários de drogar-se, tentam diminuir os riscos associados a essa prática.
O governo FHC vai trilhando a cartilha norte-americana ao adotar a confusa noção de Justiça Terapêutica. Por esse conceito, uma pessoa apanhada com drogas ilícitas em quantidades que não configurem tráfico pode ser condenada a tratamento médico em vez de cadeia.
A iniciativa denota boas intenções, mas é um desafio à lógica e a elementares princípios da psiquiatria. Se se considera a dependência um estado patológico, não há razões para condenar o doente a nenhuma espécie de pena. E é quase consenso entre psiquiatras que qualquer tratamento que não conte com a adesão do paciente está fadado ao fracasso.
Em vez de desperdiçar recursos públicos com julgamentos ilógicos e terapias que dificilmente terão sucesso, o Brasil deveria começar a preparar uma legislação consistente que se espelhe no modelo europeu. Decerto não se pode descriminalizar todas as drogas da noite para o dia. Mas insistir na Justiça Terapêutica não produz muito mais do que a superlotação de clínicas e penitenciárias.


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