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CLÓVIS ROSSI
Quem late morde
SÃO PAULO - Ao apresentar estudo sobre a Venezuela para o Council on Foreign Relations, há pouco,
o jornalista Richard Lapper, editor
de América Latina do "Financial Times", definia o presidente Hugo
Chávez como quem, até então, latia,
mas não mordia.
Alusão, como é óbvio, ao fato de
que a retórica incendiária e até revolucionária de Chávez não era
acompanhada de uma administração igualmente revolucionária.
Agora, Chávez morde. Não, a
mordida não está dada pelo tal "socialismo do século 21", embora seja
essa expressão a que causará mais
faniquitos nos setores hoje ideologicamente dominantes.
Não me assusta por dois motivos:
1 - Não sei do que se trata, mas, se
é do século 21, deve ser diferente do
fracasso que foi o do século 20 (o
único socialismo real conhecido);
2 - O capitalismo adotado na Venezuela no século 20 foi também
um baita fracasso, tanto social como econômico e ético. Só por isso
surgiu um Chávez e, por extensão, o
"socialismo do século 21".
A mordida grave, portanto, não
está dada, acho, por estatizar ou não
a energia e a telefonia. O grave é
morder a democracia.
Neste capítulo, as mordidas são
várias. A saber: a não-renovação da
concessão a um canal de TV (que
foi, sim, golpista, mas é algo que, na
democracia, se resolve ou na Justiça ou no controle remoto à mão de
cada espectador); a nomeação para
vice-presidente de um funcionário
da Justiça Eleitoral logo depois de
uma eleição em que, como todas,
houve queixas e dúvidas sobre a legalidade e/ou legitimidade de certos atos, ainda que a vitória de Chávez tenha sido incontestável; o projeto de reeleição eterna, que está
mais para Stroessner/Somoza do
que para "socialismo do século 21".
O governo Lula, que engoliu todos os "latidos" de Chávez, vai engolir também as "mordidas"?
crossi@uol.com.br
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