|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
CARLOS HEITOR CONY
A saga do Sacadura
RIO DE JANEIRO - Nascera no
Pará, acho que no interior do Estado. Não tendo nada o que fazer, alistou-se na Força Pública que acabou
incorporada às tropas do Exército
do Norte, comandado, entre outros,
por Juarez Távora durante a Revolução de 30.
Veio parar no Rio, vitorioso, mas
desempregado. Nada sabia fazer de
prático. Durante os movimentos
das tropas não chegara a dar um tiro e nenhum tiro o atingira. Tornou-se notável pelo pavor que tinha
dos defuntos e da morte.
Consta que ele veio do Pará até o
Rio dentro de um tonel do trem de
cozinha. Mesmo sendo de infantaria, passou o tempo todo servindo o
rancho dos soldados, adquirindo
certa prática nesse tipo de serviço.
Arranjou emprego num botequim do Estácio e prosperou. Dois
anos depois, era garçom na confeitaria Cavé, uma das mais elegantes
do Rio antigo. Sua feiúra era tão notável quanto seu pavor de defuntos.
Mesmo assim namorou uma prima
distante e com ela se casou -num
caso complicado que terminou na
polícia.
Na polícia começou outro caso
envolvendo o casal. Não se sabe por
que, a prima jogou sobre ele um bule de chá, provocando queimaduras
de 2º e 3º graus. Novamente desempregado, queimado e repudiado por
todos, pensou em matar-se -e só
não cometeu o desatino porque não
queria se transformar em defunto.
Chamava-se Sacadura. Não sei
como arranjou um emprego na
Leopoldina Railway e novamente
prosperou, chegando a ser extra-numerário na divisão dos dormentes. Casou-se outra vez, com uma
colega de trabalho, e, antes que ela
lhe jogasse na cara um bule de chá,
tomou ele a iniciativa de jogar o bule de chá na cara da mulher. Foi detido para averiguações e demitido
de suas funções extra-numerárias.
Na última vez que o vi, já faz muito
tempo, vendia cachorro-quente numa das entradas do Maracanã.
Texto Anterior: Brasília - Fernando Rodrigues: O PT forte Próximo Texto: Antonio Delfim Netto: Triste verdade Índice
|