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CARLOS HEITOR CONY
A farra dos lápis
RIO DE JANEIRO - Rubem Braga
estava sozinho numa cidade do interior e sentiu falta de mulher. Informou-se e foi dar com os costados
e o desejo num bar onde profissionais da noite faziam ponto. Bebeu
um pouco para calibrar e se encher
de coragem, escolheu uma delas,
muito jovem e tímida. Perguntou
quanto custava, ela respondeu de
cabeça baixa: 32,50. Rubem reclamou: "Minha filha, isso não é preço
de michê, é conta de telefone".
Lembro a história do mestre a
propósito do novo escândalo que
está sacudindo a nossa vida pública.
Autoridades e funcionários categorizados fizeram uso do cartão corporativo e parece que tudo terminará numa CPI que se arrastará o
ano todo. Evidente que houve casos
escabrosos, gente de primeiro escalão pagando aluguel de carro e hotéis cinco estrelas com dinheiro
funcional.
Mas o que está vindo a público
são despesas menores, uma delas,
de R$ 4,40, parece compra de um
maço de cigarros, e não uma corrupção das piores. É bem verdade
que cada tostão do governo gasto
indevidamente configura um abuso
de autoridade ou mesmo um crime
contra o erário da nação.
Num ano qualquer da República
Velha, quando o morro do Castelo
foi desmontado aqui no Rio, houve
uma sucessão de escândalos com o
aluguel de burros que puxavam carroças com a terra removida, que
formaria a ponta do Calabouço, onde hoje se situa o aeroporto Santos
Dumont.
Um dos empreiteiros comprou
um castelo na Espanha. Roubou-se
muito à custa dos burros, que nada
reclamavam. Quem reclamou foi
uma autoridade municipal, que
examinou as contas das empreiteiras e descobriu que engenheiros e
operários gastavam lápis demais
para os apontamentos. Houve inquéritos e demissões, a bem do serviço público, pela farra dos lápis.
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