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RUY CASTRO
Psicanálise de galinheiro
RIO DE JANEIRO - Nelson Rodrigues dizia que, se todos conhecessem a vida sexual uns dos outros,
ninguém cumprimentaria ninguém. Isso é Freud na veia -embora seja certo que Nelson chegou a
tal conclusão mais por conta própria do que pela leitura de Freud,
cujos livros só conhecia pela rama.
Sua frase vem a propósito dos milhares de pessoas que levaram os últimos dez dias se esbaldando em
piadas sobre o mau passo dado por
Ronaldo Fenômeno com os travestis que, na sua versão, ele imaginava
mulheres. Supõe-se que esses piadistas levem uma vida sexual acima
de qualquer suspeita -ou não estariam apenas atribuindo ao jogador
certas fantasias que carregam consigo e escondem até de si mesmos?
Não é incomum que celebridades
como Ronaldo, com dinheiro a rodo, um poder quase inimaginável e
acesso a praticamente qualquer
mulher que desejem, sejam acometidas de um tédio profundo nesse
departamento -porque, para ter
essa mulher, basta-lhes levantar
um dedo, se tanto. Um aspone se
encarregará do contato, do carreto
e das despesas de produção. Ao herói, bastará o desempenho no leito.
Mas até quando ele continuará a ser
um herói para si mesmo?
Aconteceu em 1995 com o astro
Hugh Grant, flagrado pela polícia
numa cena de sexo oral com uma
prostituta num carro estacionado
em Los Angeles. Por que Grant, então com 35 anos e no auge da carreira, teria de pagar para fazer sexo?
Porque, às vezes, a excitação pode
estar em rebaixar-se.
Cansado das mulheres deslumbrantes que, desde os seus 19 anos,
se atiraram em seu caminho e em
sua cama, Ronaldo teria sentido
uma nostalgia por algo que nunca
experimentou: o mergulho no "bas-fond". Talvez só não o imaginasse
tão baixo. É uma teoria. Mas, como
também diria Nelson, isso é pura
psicanálise de galinheiro.
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