São Paulo, sábado, 10 de maio de 2008

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RUY CASTRO

Psicanálise de galinheiro

RIO DE JANEIRO - Nelson Rodrigues dizia que, se todos conhecessem a vida sexual uns dos outros, ninguém cumprimentaria ninguém. Isso é Freud na veia -embora seja certo que Nelson chegou a tal conclusão mais por conta própria do que pela leitura de Freud, cujos livros só conhecia pela rama.
Sua frase vem a propósito dos milhares de pessoas que levaram os últimos dez dias se esbaldando em piadas sobre o mau passo dado por Ronaldo Fenômeno com os travestis que, na sua versão, ele imaginava mulheres. Supõe-se que esses piadistas levem uma vida sexual acima de qualquer suspeita -ou não estariam apenas atribuindo ao jogador certas fantasias que carregam consigo e escondem até de si mesmos?
Não é incomum que celebridades como Ronaldo, com dinheiro a rodo, um poder quase inimaginável e acesso a praticamente qualquer mulher que desejem, sejam acometidas de um tédio profundo nesse departamento -porque, para ter essa mulher, basta-lhes levantar um dedo, se tanto. Um aspone se encarregará do contato, do carreto e das despesas de produção. Ao herói, bastará o desempenho no leito. Mas até quando ele continuará a ser um herói para si mesmo?
Aconteceu em 1995 com o astro Hugh Grant, flagrado pela polícia numa cena de sexo oral com uma prostituta num carro estacionado em Los Angeles. Por que Grant, então com 35 anos e no auge da carreira, teria de pagar para fazer sexo? Porque, às vezes, a excitação pode estar em rebaixar-se.
Cansado das mulheres deslumbrantes que, desde os seus 19 anos, se atiraram em seu caminho e em sua cama, Ronaldo teria sentido uma nostalgia por algo que nunca experimentou: o mergulho no "bas-fond". Talvez só não o imaginasse tão baixo. É uma teoria. Mas, como também diria Nelson, isso é pura psicanálise de galinheiro.


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