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RUY CASTRO
Paz para abanar o rabo
RIO DE JANEIRO - Um dos melhores indicadores do clima de uma
favela são os cachorros. Sua atitude
diante de pessoas estranhas ao
morro define se a comunidade está
pacificada ou não. Nas favelas conflagradas, os cachorros saem correndo à menor visão de um par de
botas -as botas da PM. Sabem que,
se não ficarem espertos, serão chutados para sair da frente ou pisados
por gente em fuga, o que acontece
quando a polícia sobe o morro.
Outro aferidor seguro são as
crianças. Nas comunidades em
guerra, as crianças se mostram pouco, e as que aparecem, amadurecidas a pulso, olham duro para os de
fora. Suas brincadeiras são condicionadas pelas facções em luta, que
demarcam os territórios e, quando
abrem fogo entre si, não ligam para
inocentes na linha de tiro. Ou pelas
milícias, que também não sabem
usar talher de peixe.
Outro dia, ao subir a uma favela
no Catete, vi uma cadela amamentando sua ninhada no meio da passagem principal. As pessoas se desviavam para não perturbar a função. Mas, claro, era o morro Tavares
Bastos, onde, há anos, o Bope (Batalhão de Operações Policiais Especiais) inaugurou uma nova relação
entre polícia e moradores, que está
agora se espalhando com as UPPs
(Unidades de Polícia Pacificadora).
Um dos vários morros recém-premiados com uma UPP e reintegrados ao Rio foi o da Providência,
histórico, secular, ex-da Favela. Um
fotógrafo nascido e criado lá me disse que aquela era a sexta ocupação
da Providência desde que ele usava
fraldas. Mas a primeira em que estava levando fé.
Perguntei-lhe pelos cachorros e
crianças da Providência. Respondeu que, depois de muito tempo, os
cachorros estavam abanando o rabo para os estranhos e os garotos jogavam pelada contra os dos morros
vizinhos e pareciam ter a idade que
efetivamente tinham.
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