São Paulo, sábado, 10 de julho de 2010

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TENDÊNCIAS/DEBATES

As operadoras de plano de saúde devem reembolsar serviços prestados pelo SUS?

SIM
É dever constitucional ressarcir o SUS

JULIANA FERREIRA

O setor de planos de saúde é o mais reclamado no Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor) há 11 anos, e uma das principais reclamações consiste na negativa de cobertura pelas operadoras de cirurgias, exames, insumos, entre outros.
Esse cenário se repete na Justiça, onde a quase totalidade dos conflitos entre usuários e operadoras de planos de saúde dizem respeito a negativa ou limitação de cobertura.
A recusa de cobrir procedimentos, principalmente aqueles que demandam altos custos, é prática reiterada das operadoras de planos de saúde, o que acaba por empurrar os consumidores para o Sistema Único de Saúde (SUS), que presta um serviço para o qual as empresas privadas já foram pagas e têm o dever contratual e legal de prestar.
Para corrigir esse desvio que ocorre entre o sistema público e o privado, o artigo 32 da lei nº 9.656/ 98 estabeleceu o instrumento do ressarcimento ao SUS.
Tal artigo prevê que deverão ser ressarcidos pelas operadoras de planos de saúde os serviços de atendimento à saúde previstos nos respectivos contratos, mas prestados aos consumidores e respectivos dependentes por instituições públicas ou privadas, conveniadas ou contratadas, integrantes do SUS.
Inconformada com a obrigação de reembolsar o SUS, a Confederação Nacional de Saúde (CNS), que congrega interesses de prestadores de serviços de saúde privados e de operadoras de planos de saúde, ajuizou no Supremo Tribunal Federal (STF) a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 1.931.
Essa medida foi tomada logo após a edição da lei de planos de saúde, pleiteando a declaração de inconstitucionalidade de diversos dispositivos da lei nº 9.656/98, inclusive do mencionado artigo 32. Porém, o pleno do STF decidiu por não conceder a liminar pleiteada para suspender esse dispositivo.
O relator, ministro Maurício Corrêa, refutou os argumentos da CNS. Isso por entender que o ressarcimento ao SUS não afronta qualquer dispositivo constitucional, já que serviços cobertos em contrato que não são atendidos pelas operadoras no momento de sua necessidade e foram prestados pela rede do SUS e por instituições conveniadas devem ser ressarcidos à administração pública.
Apesar de negada a liminar pelo STF, as operadoras permaneceram resistindo ao ressarcimento ao SUS, ajuizando ações para evitar essa cobrança. Os tribunais de 2ª instância, principalmente o Tribunal Regional Federal da 2ª Região, têm reiteradamente reconhecido a legalidade e constitucionalidade do ressarcimento ao SUS, assim como o Superior Tribunal de Justiça.
E, nos últimos dois anos, tais ações estão chegando ao STF, que tem entendido que a pendência de decisão final na ADI nº 1.931 não impede o julgamento de outros processos sobre idêntica controvérsia e tem reconhecido a constitucionalidade do ressarcimento ao SUS.
Assim, criado pelo Poder Legislativo e com sua legalidade e constitucionalidade reiteradamente reconhecida pelo Poder Judiciário, resta apenas o ressarcimento ao SUS ser efetivamente implementado pelo Poder Executivo, por meio da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), órgão responsável para tanto, mas que pouco fez até agora.
Mais que um instrumento para viabilizar o resgate de parte dos gastos do sistema público de saúde, que possui orçamento restrito se comparado à demanda da população, com o atendimento de clientes de planos de saúde, o ressarcimento ao SUS deve ser visto como mais um meio para combater a prática abusiva e ilegal de recusa de cobertura pelos planos de saúde.

JULIANA FERREIRA, pós-graduada em direito administrativo, é advogada do Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor).


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