São Paulo, segunda-feira, 10 de setembro de 2007

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IGOR GIELOW

O sonho dos senadores

BRASÍLIA - Angeli, mestre da charge política brasileira, brindou ontem os leitores desta página com uma brilhante revisão de "O sonho da razão produz monstros", na qual Renan Calheiros é assombrado pelas acusações que o circundam.
"O sonho..." é um dos "Caprichos", série de gravuras feita no fim do século 18 pelo maior pintor da história espanhola, Francisco de Goya y Lucientes (OK, sempre vão dizer que o posto é de Velázquez), pai involuntário da arte dita moderna. Nela, o pintor adormece e, no "sonho da razão", é assaltado por fantasmas internos -que, em seu caso, desembocariam nas magistrais e perturbadoras "Pinturas Negras", feitas no final de sua atribulada existência.
Tal e qual o Renan-Goya de Angeli devem estar não só o presidente da Casa mas vários dos senadores que votarão pela sua cassação ou não depois de amanhã. O motivo é simples: durmam, isentem Renan e verão monstros se abaterem sobre a imagem do Senado e suas próprias reputações. Cassem o par e encontrem a ameaça velada: quem mesmo entre eles sobreviveria a um escrutínio de suas atividades, digamos, extraparlamentares?
Passada a quizumba ACM-Jader, em 2001, o Senado conseguiu realimentar o mito de Casa "nobre", de "grandes debates", deixando para o varejão da Câmara a má fama que explodiu com o mensalão de 2005.
O mito virou pó. Os "grandes articuladores" são linhas auxiliares de Lula, dividindo espaço com neófitos histriônicos e oposicionistas que adoram um acordo. Há exceções só para justificar o clichê.
Poucos são os senadores que devem estar à vontade com a possibilidade de uma exposição à la Renan. Para sorte deles, e talvez para a do alagoano, o comodismo da política brasileira deverá dar o tom. Sabe-se lá quais monstros apareceriam.
Uma coisa, contudo, é certa: de nenhum deles se espera uma "Pintura Negra" como legado.

igielow@folhasp.com.br


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