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São Paulo, sexta-feira, 10 de outubro de 2003

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CLÓVIS ROSSI

O Brasil é uma fraude

SÃO PAULO - Perdão pelo título forte, mas não há outra conclusão possível quando se descobre que 25 artigos da Constituição vigente ou não foram nunca votados ou só o foram uma vez, o que é igualmente irregular.
Eminentes juristas discordarão, mas não dá para inocentar de fraude o resto da chamada Lei Maior. É legítimo desconfiar que, se foi possível impunemente "maracutaiar" 25 artigos, pode igualmente ter havido outras fraudes que, simplesmente, não foram (ainda) detectadas.
Aí, vem o presidente do Supremo, suposto guardião maior da Lei Maior, e diz: "Tudo está sepultado pelo tempo".
Se houvesse Prêmio Nobel para o pensamento jurídico, desconfio que ele não seria atribuído a Maurício Corrêa, na discutível hipótese de que se candidatasse.
Levada sua lógica às últimas consequências, deveríamos:
1 - anistiar Hitler e esquecer o Holocausto, "sepultado pelo tempo" há mais anos que a fraude na Constituição de 1988;
2 - soltar quem cometeu algum crime em 1988 e ainda está na cadeia (se é que há alguém). Afinal, se se tolera impunemente a fraude na Lei Maior, não há crime maior que não mereça a tolerância, certo?
O diabo é que Corrêa tem razão do ponto de vista pragmático. A fraude não tem volta. Considerar a Constituição uma fraude equivaleria a considerar ilegítimos o último ano do governo Sarney, o primeiro sob a égide da Carta de 1988, e os mandatos de todos os seus quatro sucessores, eleitos nos termos da Constituição.
Por extensão, ficam passíveis de questionamento todos os atos de Fernando Collor de Mello, de Itamar Franco, de Fernando Henrique Cardoso e de Luiz Inácio Lula da Silva.
De atos ou ditos presidenciais, só vale o do general De Gaulle, a quem se atribui a tardia descoberta de que o Brasil não é um país sério.


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