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CLÓVIS ROSSI
O Brasil é uma fraude
SÃO PAULO - Perdão pelo título forte,
mas não há outra conclusão possível
quando se descobre que 25 artigos da
Constituição vigente ou não foram
nunca votados ou só o foram uma
vez, o que é igualmente irregular.
Eminentes juristas discordarão,
mas não dá para inocentar de fraude
o resto da chamada Lei Maior. É legítimo desconfiar que, se foi possível
impunemente "maracutaiar" 25 artigos, pode igualmente ter havido outras fraudes que, simplesmente, não
foram (ainda) detectadas.
Aí, vem o presidente do Supremo,
suposto guardião maior da Lei
Maior, e diz: "Tudo está sepultado
pelo tempo".
Se houvesse Prêmio Nobel para o
pensamento jurídico, desconfio que
ele não seria atribuído a Maurício
Corrêa, na discutível hipótese de que
se candidatasse.
Levada sua lógica às últimas consequências, deveríamos:
1 - anistiar Hitler e esquecer o Holocausto, "sepultado pelo tempo" há
mais anos que a fraude na Constituição de 1988;
2 - soltar quem cometeu algum crime em 1988 e ainda está na cadeia (se
é que há alguém). Afinal, se se tolera
impunemente a fraude na Lei Maior,
não há crime maior que não mereça
a tolerância, certo?
O diabo é que Corrêa tem razão do
ponto de vista pragmático. A fraude
não tem volta. Considerar a Constituição uma fraude equivaleria a considerar ilegítimos o último ano do governo Sarney, o primeiro sob a égide
da Carta de 1988, e os mandatos de
todos os seus quatro sucessores, eleitos nos termos da Constituição.
Por extensão, ficam passíveis de
questionamento todos os atos de Fernando Collor de Mello, de Itamar
Franco, de Fernando Henrique Cardoso e de Luiz Inácio Lula da Silva.
De atos ou ditos presidenciais, só
vale o do general De Gaulle, a quem
se atribui a tardia descoberta de que
o Brasil não é um país sério.
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