|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
ELIANE CANTANHÊDE
Terra de ninguém
BUENOS AIRES - Em vez de se indignarem tanto com a sugestão de inspeção da ONU no Judiciário brasileiro, por que o presidente do Supremo,
as associações de magistrados e a
OAB não se indignaram com o assassinato de duas testemunhas de execuções sumárias?
Ontem, choveram notas e mensagens na internet contra a inspeção
proposta pela relatora da ONU para
execuções sumárias, Asma Jahangir.
O presidente do Supremo, Maurício
Corrêa, foi além: aproveitou o ensejo
para dar nova bordoada em Lula.
Além de atacar a idéia da relatora
como uma "agressão à nossa independência", Corrêa acusou Lula de
ter "total má vontade" com a Justiça.
O presidente da República, aparentemente, não se abalou. Tanto que José
Dirceu ratificou que o governo não vê
nada de mais na inspeção.
E os assassinados? Flávio Manoel
da Silva contou horrores a Asma Jahangir e acabou morto à queima-roupa na Paraíba. Gerson Jesus Bispo
relatou a ela como seu irmão foi vítima de um grupo de extermínio, supostamente de PMs. Teve o mesmo
fim, ontem, na Bahia.
Execuções, balas perdidas, tiroteios
à luz do dia viraram rotina nas nossas cidades, onde os governos perdem
a guerra cotidiana para a violência e
onde a nossa Justiça -com toda a
sua independência e soberania- é
articuladíssima para manter privilégios, mas dá de barato a lentidão, a
falta de estrutura, a inoperância. Falar no desejável "controle externo" já
é um escândalo. O que dizer de inspeção internacional?!
Para não me acusarem de mais
uma vez defender o governo do PT
nos seus embates com o Judiciário,
aqui vai uma perguntinha para Lula
e Dirceu: se é mesmo bacana uma
inspeção no Brasil, por que teria sido
ingerência indevida a tão esperada e
frustrada manifestação de Lula pelos
direitos humanos em Cuba?
Enquanto os poderosos discutem
soberania em gabinetes e expõem as
suas divergências publicamente, os
Silvas e os Bispos são mortos e esquecidos, anônimos e desimportantes.
Em Cuba, Fidel executa. No Brasil, os
governantes deixam executar.
Texto Anterior: São Paulo - Clóvis Rossi: O Brasil é uma fraude Próximo Texto: Rio de Janeiro - Marcelo Beraba: Críticas e reformas Índice
|