São Paulo, segunda-feira, 10 de outubro de 2005

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FERNANDO RODRIGUES

Depois da crise, abulia

BRASÍLIA - Um irmão de Lula é suspeito de traficar influência. O filho de Zé Dirceu pode ter sido beneficiado pelo governo. Não importa. A abulia do brasileiro não tem fim.
A inexistência de reação popular somada à estabilidade e ao crescimento da economia são sinais de que Lula e a maioria de sua tropa não serão punidos -a não ser que o caso do "mensalão" ressurja pelas mãos e bocas de pobres coitados que assumiram toda a culpa sozinhos.
Até agora, apesar da fartura de indícios do esquema de corrupção envolvendo amplos setores do Congresso e do Poder Executivo, nunca houve manifestação pública de repúdio nas ruas. Ao contrário, teve até ato chapa-branca de estudantes a favor do governo. Enquanto isso, os shoppings e os aeroportos continuam lotados. Como cunhou James Carville nos EUA, "é a economia, estúpido".
Na sexta-feira, o presidente da República chamou para dentro do Palácio do Planalto petistas acusados de corrupção. Disse que não eram corruptos. São, na realidade, réus confessos de, no mínimo, terem usado dinheiro ilegal em campanhas eleitorais. O que aconteceu depois dessa atitude tresloucada de Lula? Nada. Um artigo ou outro de jornal e mais nada. É como se o conjunto dos brasileiros sofresse de um processo inesperado, súbito, de afasia.
Nas próximas semanas, os nomes de apenas 13 congressistas serão enviados para julgamento. Alguns vão renunciar. Escaparão da punição. Num sinal de que a política está de ponta-cabeça, o PSDB, em tese o principal partido de oposição, aplaude a eventual onda de renúncias.
Ao final, menos de dez deputados poderão resultar cassados. É um número semelhante ao de 1994, quando a CPI do Orçamento vasculhou esquema muito menor de corrupção.
Qual será a reação a esse número restrito de punições? Zero ou quase zero. É o Brasil no seu melhor. Cordialidade dissimulada é a nossa marca. E o nosso maior atraso.

frodriguesbsb@uol.com.br

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