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JOÃO SAYAD
Buraco negro
Em 1994, foi a taxa de câmbio. Contra a opinião de todos, o Banco
Central manteve a taxa cambial sobrevalorizada por quatro anos em nome
do combate à inflação.
Para combater a inflação, bastaria
manter a taxa de câmbio estável (R$ 3
por dólar, por exemplo). Não era preciso manter o dólar barato (R$ 1 por
dólar). Economistas de fora e de dentro do governo criticaram a fixação da
taxa cambial desde o início.
A política durou quatro anos. Reduziu a competitividade da indústria e as
exportações agrícolas e diminuiu o
emprego. A dívida interna brasileira
cresceu 36% do PIB (de 24% para 60%
do PIB) porque o governo manteve juros altos e tomou empréstimos em dólar para manter a política de câmbio
barato. Só o mercado conseguiu forçar a mudança, retirando bilhões de
dólares do pais.
Cientistas políticos não tentaram explicar como decisão tão prejudicial
para indústria, agricultura e trabalhadores conseguiu se manter por tanto
tempo. Batizaram o enigma de populismo cambial. É um nome, mas não
explica por que o sistema político brasileiro, democrático, aberto e dominado pelas elites, é tão vulnerável ao populismo. São coisas do passado, e
quem olha para trás vira estátua de sal.
Agora, estamos sufocados por juros
reais maiores do que 10% que prevalecem desde 2003. No começo do governo, as taxas altas se justificavam como
forma de combater o medo criado pela retórica do PT. O medo passou, o
tempo passou, mas os juros continuaram altos.
Economistas do Banco Central justificam a decisão em trabalhos estatísticos que mostram que taxas de juros
menores que 10% provocam inflação.
São pessoas cuja experiência como
adultos começou em 1994. Conheceram apenas os anos de crises financeiras internacionais e de sobrevalorização do real e o ano eleitoral em que o
PT ganhou as eleições.
Em 2003, a opinião dos economistas
brasileiros ainda estava dividida. Com
o tempo, a opinião é unânime: o juro
alto é um erro que custa ao país 7% do
PIB há três anos, ou 21% do PIB até
agora. E faz com que a taxa cambial seja menor do que a de outros países da
América Latina. Estamos perdendo a
oportunidade de crescer mais rápido
enquanto a economia mundial é favorável. Do ponto de vista econômico,
não há explicação.
Não pode ser chamada de populismo. Talvez a algazarra sobre corrupção desvie a atenção dos juros tão altos. O mistério permanece: como é
possível que o sistema político brasileiro não consiga dar voz a agricultores, industriais e trabalhadores?
A política monetária no Brasil sempre foi independente. No tempo dos
governos militares, era o orçamento
monetário que distribuía benefícios
sem nenhum tipo de autorização. Pelo
menos eram benefícios.
Mesmo assim, o Banco Central clama por independência. A história
mostra total autonomia. Ainda que
seja independente do Poder Executivo, precisa ser dependente de alguma
outra coisa que ninguém diz qual é.
Como está, é um imenso buraco negro, tão fundo que não permite ouvir
os gritos dos produtores, exportadores e trabalhadores e tão escuro que
anula todas as iniciativas públicas e
privadas.
João Sayad escreve às segundas-feiras nesta coluna.
jsayad@attglobal.net
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