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MELCHIADES FILHO
O prêmio jabuti
BRASÍLIA - É fato que Lula bateu
o recorde de medidas provisórias e
que estas entulham a pauta e travam as votações. Mas o Congresso
está longe de se rebelar. Na verdade, deseja ardentemente os decretos -e não só para fechar o toma-lá-dá-cá, como se poderia imaginar.
Para emplacar uma nova lei, o
parlamentar tem de encarar uma
via-crúcis. Precisa submeter o texto
a pelo menos duas comissões antes
de tentar construir uma maioria
que resista à seqüência de votações
nas Casas e à caneta do presidente.
A medida provisória não. Ela pula
comissões, fura a fila do plenário e
vem com prazo para ser apreciada,
além de ter validade imediata.
Ao optar pela avalanche de MPs,
Lula acirrou a dor-de-cotovelo. Não
podia ser outro o desfecho quando
o Congresso descobriu que é possível grudar um projeto de lei no decreto do Planalto -e que a aprovação deste arrasta a daquele.
Uniu-se o útil ao agradável: um
despachante poderoso como o presidente e a conveniência política de
legislar no contrabando, longe do
escrutínio e do debate públicos.
Desse modo, uma MP sobre casa
própria acabou versando também
sobre embalagens de leite. Uma sobre IR rebocou regras para motoristas de vans. E por aí foi-e-vai.
Para quem havia estranhado a
gritaria geral na Câmara quando o
Executivo cancelou três MPs para
acelerar a tramitação da CPMF, um
esclarecimento: ninguém dava pelota para o conteúdo das medidas.
Os apêndices é que interessavam.
Resultado: além de batalhar para
aprovar a MP, os coordenadores da
base aliada agora têm de administrar a sanha anexadora das minibancadas regionais ou setoriais e o
assédio dos lobbies privados. Relatar MP virou tarefa cobiçadíssima.
Nesse mundo de sujeitos ocultos,
a ordem é antecipar a próxima fornada de decretos e engatar o que
por aqui ganhou o apelido de jabuti.
Para essa turma, CPMF é assunto
vencido. As reais oportunidades de
negócio estão na MP da TV Pública.
mfilho@folhasp.com.br
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