São Paulo, quinta-feira, 10 de novembro de 2005

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CLÓVIS ROSSI

O problema é global

SÃO PAULO - Em meados do ano passado, a TV belga exibiu documentário sobre a vida dos imigrantes argelinos no país. Em meio aos problemas habituais de discriminação e pobreza, aparecia um executivo de empresa belga para dizer que, ao contrário da sabedoria convencional, ele preferia empregar muçulmanos porque suas mulheres eram submissas e, portanto, não reclamavam de o marido ficar mais tempo fora de casa, em horas ou dias extras, ao contrário das mulheres belgas.
Ou, posto de outra forma, quando os costumes (supostos ou reais) dos imigrantes são pró-empresa, tudo bem. Agora que os, digamos, costumes dos imigrantes muçulmanos na França passaram a ser o de botar fogo em meio país, o ministro do Interior, Nicolas Sarkozy, saca do coldre a idéia de expulsar os estrangeiros detidos nos incidentes.
Do ponto de vista jurídico-policial, é até explicável. Cometeu crime no país de acolhida, é expulso. Do ponto de vista das tradições da França como país de asilo, soa a aberração.
Note-se que Sarkozy não é um desses brucutus xenófobos da extrema-direita. É estrela em ascensão da política francesa, a única aliás.
A reação do ministro mostra que as perplexidades estão espalhadas por todo o arco político-ideológico e vão, ademais, bem além da França. Mesmo os britânicos, tradicionais rivais dos franceses, evitam exibir seu próprio modelo dito multicultural como exemplo. No que fazem bem: não há diferença, em termos de fracasso da integração étnica, entre incendiar carros na França ou explodir trens do metrô em Londres. É bom lembrar que um dos acusados dos atentados ao metrô londrino era filho do dono de um "fish and chips", o mais tradicional fast food local.
Não dá, pois, para falar em crise do modelo social francês. Se há crise, é global. Dos países pobres, Brasil inclusive, pela incapacidade de darem sonhos a todos os seus. Dos países ricos, porque atraem os pobres, mas já não conseguem atendê-los.

@ - crossi@uol.com.br


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