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ELIANE CANTANHÊDE
Caindo na real
BRASÍLIA - Enfim o governo federal vai patrocinar discussões sobre mudanças na legislação sobre o aborto.
É o mínimo que se esperava de um
governo do PT. E já não era sem tempo, porque há anos que petistas apresentam projetos permitindo a prática. O do presidente do partido, José
Genoino, é de 1995.
A questão é, obviamente, delicada.
Há décadas tenta-se colocar o tema
em pauta, mas tudo o que é tratado
como tabu não é discutido realmente, apenas jogado nas gavetas do
atraso. E o grande adversário do PT
nessa discussão é um velho aliado em
outros campos de luta: a Igreja Católica.
Algumas premissas precisam ficar
claras para início de conversa. Ninguém faz apologia do aborto em si e
muito menos quer repetir a China,
por exemplo, onde a prática não é
apenas permitida como fortemente
estimulada pelo Estado como política
de controle da natalidade.
No Brasil, onde até o aborto em caso de fetos sem cérebro é proibido, o
que está em debate é muito mais simples: a descriminalização. Ou seja,
apenas retirar do Código Penal as
punições previstas para as mulheres
que, a seu livre-arbítrio, fizeram, fazem ou vierem a fazer aborto.
Até porque essa lei é hipócrita.
Quem quer fazer aborto faz de qualquer maneira, e quem não admite fazer não faz de maneira nenhuma,
com lei ou sem lei proibindo. Aliás,
milhares de mulheres fazem aborto
anualmente, as mais pobres correndo
risco de morte, e ninguém é preso por
isso. Trata-se, pois, de uma lei para
inglês e para bispo verem.
A Secretaria Especial de Políticas
para as Mulheres está abrindo a discussão, criando um grupo específico
para isso e possibilitando que as teses
favoráveis e contrárias sejam amplamente defendidas -ou ratificadas,
porque, há muito, bem conhecidas.
No final, a mudança da lei deve enfim sair. E vai ser mais uma daquelas
coisas que, depois de aprovadas, todo
mundo vai se perguntar: afinal, por
que demorou tanto?
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