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GERAÇÃO SACRIFICADA
Os repórteres Fernanda Mena e João Wainer traçaram, no
caderno Folhateen de ontem, uma
impressionante anatomia dos adolescentes brasileiros recrutados pelo
tráfico de drogas. Eles fazem parte de
uma geração que tem sua vida abreviada pela violência. Vítimas e algozes, aprenderam a conviver com ela,
sob uma espécie de "lei da selva".
Somente no Rio, morrem mais jovens assassinados do que em cinco
países sob guerra civil, segundo pesquisa do Instituto de Estudos da Religião. No Brasil, as mortes por causas
externas, incluindo homicídio, respondem por 65,8% dos óbitos entre
os homens na faixa de 15 a 29 anos.
Fatalismo, revolta, sedução pelo
poder das armas e anseios de consumo são traços comuns aos "soldados" entrevistados pela reportagem.
Numa sociedade na qual os bens que
conferem status não são acessíveis a
todos pela educação e pelo trabalho,
o crime parece-lhes o único caminho, sem impedimento moral ou crise de consciência. "Quero ter o que é
meu", diz "Luiz", 16, cujo ganho
mensal, de até R$ 1.500, é quase o
dobro da renda média dos trabalhadores, segundo o IBGE.
"André", outro entrevistado, é o
único sobrevivente dos 16 personagens de um documentário sobre jovens traficantes -a família, e não o
Estado, o resgatou do crime. Os "soldados", como os chefes das facções
a que servem, se apropriam da retórica antiestablishment para justificar-se: "As pessoas da favela só são vistas
na hora de votar. Cesta básica, a gente corre atrás e consegue dinheiro para comprar. A gente precisa é de estrutura", afirma Luiz.
O discurso apenas tangencia a causa da existência de um contingente
tão numeroso de recrutas potenciais
do crime. A "estrutura", sob a forma
de serviços de educação e saúde, chega, ainda que precariamente, às comunidades mais pobres das metrópoles brasileiras. Mas o que parece
determinar a atração fatal exercida
pelo tráfico é a imensa desigualdade
social existente no país.
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