São Paulo, terça-feira, 11 de maio de 2004

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CARLOS HEITOR CONY

Piada do destino

RIO DE JANEIRO - Destino é destino, e nem é preciso lembrar o caso de Édipo para saber que não se deve saber o que ele nos reserva. Pulando de Tebas para Garanhuns, do rei Édipo para o presidente Lula, podemos acompanhar o destino de dois personagens, um deles trágico, o outro mais ou menos cômico.
É possível que Lula nunca tenha consultado um oráculo, mas, se o fez, não deve ter acreditado nele. Como imaginar que o retirante nordestino chegaria à Presidência da República? É bem verdade que houve antecedentes ao longo da história, pessoas de origem humilde que chegaram lá. Até aí, é possível que Lula, embora achando difícil, desconfiasse que, com um pouco de sorte e muito jeitinho, poderia dar a volta por cima.
Se, aos 16, 17 anos, um vidente lhe profetizasse que chegaria ao topo, é possível que Lula, embora achando muita cocada para ele, no fundo no fundo se perguntasse: "Por que não?".
Mas nenhum vidente, nem em Tebas, nem em Garanhuns, poderia prever que ele teria de perder tempo e prestígio por causa dos bingos. Sua carreira política foi feita em defesa de causas nobres: emprego, salário, saúde, justiça social, solidariedade humana, essas coisas.
De repente, passa mais de uma semana reunindo-se até altas horas da noite com os funcionários mais graduados do governo para encontrar um jeito de fechar bingos! Acredito que ao longo de sua vida, de sua liderança popular, de seu ideário político, ele nunca tenha pensado em bingo, a não ser como lazer pessoal, para relaxar de suas lutas sindicais, um joguinho inocente com amigos e parentes, na base do grãozinho de milho quando não houvesse fichas para todos.
De repente -é bom que repita o de repente-, fechar ou abrir bingos torna-se agenda prioritária do Partido dos Trabalhadores. Depois dos bingos, o governo jogará tudo para disciplinar as brigas de galo.


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