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Mais social, menos visibilidade
MÁRIO REALI e ENIO TATTO
A peça orçamentária revela que o governo Serra prioriza obras de visibilidade eleitoral e freia investimentos nas áreas sociais
PELO TERCEIRO ano consecutivo, a Comissão de Finanças e Orçamento da Assembléia Legislativa realiza audiências públicas nas
regiões administrativas e metropolitanas para discutir a elaboração do
Orçamento estadual de 2008.
Propostos pela bancada do PT em
2005, os encontros demonstram cada
vez mais que a sociedade organizada e
os poderes locais são peças fundamentais para que o Orçamento público reflita realmente as necessidades
da população no Estado. E que a sua
consolidação não pode ficar à mercê
de interesses políticos de plantão.
Neste ano, as demandas por mais
investimento em saúde, educação, saneamento, moradia e segurança e a situação do funcionalismo público ativo e aposentado deram a tônica dos
encontros. Mas, infelizmente, pela
análise da peça orçamentária enviada
para a Assembléia Legislativa, notamos uma aplicação às avessas que
confronta a realidade resultante das
audiências públicas: o governo Serra
prioriza grandes obras de visibilidade
eleitoral e, em contrapartida, freia investimentos nas áreas sociais.
A Secretaria da Educação, por
exemplo, terá um aumento de 11,27%
em relação a 2007, percentual menor,
porém, do que o crescimento orçamentário geral, que subirá 12,02%.
Com isso, sua participação no Orçamento total cai de 14,12%, em 2007,
para 14,02%, em 2008.
A Secretaria da Saúde terá um crescimento ainda menor: de 6,56%. Desse modo, sua participação no "bolo
orçamentário" cai de 10,11%, em
2007, para 9,61%, em 2008. A Secretaria da Segurança Pública terá um
aumento de apenas 4,92% em relação
a 2007. Portanto, também perderá
participação, passando de 9,81%, em
2007, para 9,16%, em 2008. Somente
nesses dois casos, a falta de recursos é
estimada em mais de R$ 800 milhões.
Por outro lado, podemos observar
que as secretarias dos Transportes e
dos Transportes Metropolitanos terão seus orçamentos acrescidos em
33,7% e 43,84%, respectivamente.
Nessa mesma linha se inclui o aumento do orçamento da Secretaria da
Administração Penitenciária, que subirá 27,51%.
A agenda eleitoral torna-se mais
evidente quando notamos que, novamente, o Orçamento de 2008 será subestimado, a exemplo do ocorrido nos
anos anteriores. Para 2007, foi estimado o valor de R$ 84 bilhões para o
total do Orçamento, porém, até o final
deste ano, esse número deverá superar os R$ 90 bilhões.
As projeções também apontam
que, em 2008, entrarão para os cofres
estadual entre R$ 101,2 bilhões e R$
105,5 bilhões, e não os R$ 95 bilhões
anunciados. Com isso, o governo amplia sua margem de remanejamento
de recursos, prevista em mais de R$
10 bilhões, sem necessidade de aprovação pela Assembléia Legislativa.
Vale destacar a participação organizada dos representantes dos funcionários públicos aposentados em praticamente todas as audiências realizadas, eles que estão sentindo no bolso os anos da política de bônus sem
reajuste nos salários. Infelizmente, o
arrocho salarial deverá continuar, já
que as despesas com pessoal e encargos (pagamento da folha do servidor e
aposentadoria) crescerão apenas
1,3%, enquanto as outras despesas
correntes subirão 16,76%.
As demandas mais presentes, tanto
no interior quanto nas regiões metropolitanas, foram os investimentos na
saúde, principalmente no atendimento secundário, exemplificado na necessidade de construção de mais hospitais de referência e também na ajuda às santas casas.
Outra preocupação freqüente e que
está sintonizada com o atual estágio
de recuperação econômica do país é o
pedido de mais cursos de formação
técnica que atendam a demanda do
mercado.
Nas regiões metropolitanas da
Grande São Paulo e do ABCD, bem
como em Campinas e na Baixada Santista, ficou evidente a necessidade de
investimentos em saneamento básico, sobrando críticas à Sabesp, e também na área de moradia, principalmente aquela afeta às famílias de baixa renda. Sobre a segurança pública,
foi reiterada a preocupação, constatada por pesquisa da Fundação Getulio
Vargas, mais do que de investimentos
no setor, de criar mecanismos de
combate à corrupção policial.
As solicitações das regiões administrativas e metropolitanas serão transformadas em emendas parlamentares para que sejam incluídas no Orçamento de 2008, mas que terão que
passar, antes, pelo crivo do governo
estadual. Dessa vez, esperamos que as
demandas sejam analisadas sob a luz
da realidade do nosso Estado, que,
apesar de ser o mais rico da Federação, enfrenta dificuldades que podem
comprometer o seu futuro e que foram deixadas à margem na proposta
governamental.
MÁRIO REALI, 50, arquiteto e urbanista, mestre pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, é deputado
estadual de São Paulo (PT) e membro da Comissão de Finanças e Orçamento da Assembléia Legislativa.
ENIO TATTO, 47, contador, é deputado estadual de São
Paulo (PT) e líder da minoria na Assembléia Legislativa.
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