São Paulo, terça-feira, 11 de dezembro de 2007

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Mais social, menos visibilidade

MÁRIO REALI e ENIO TATTO

A peça orçamentária revela que o governo Serra prioriza obras de visibilidade eleitoral e freia investimentos nas áreas sociais

PELO TERCEIRO ano consecutivo, a Comissão de Finanças e Orçamento da Assembléia Legislativa realiza audiências públicas nas regiões administrativas e metropolitanas para discutir a elaboração do Orçamento estadual de 2008.
Propostos pela bancada do PT em 2005, os encontros demonstram cada vez mais que a sociedade organizada e os poderes locais são peças fundamentais para que o Orçamento público reflita realmente as necessidades da população no Estado. E que a sua consolidação não pode ficar à mercê de interesses políticos de plantão.
Neste ano, as demandas por mais investimento em saúde, educação, saneamento, moradia e segurança e a situação do funcionalismo público ativo e aposentado deram a tônica dos encontros. Mas, infelizmente, pela análise da peça orçamentária enviada para a Assembléia Legislativa, notamos uma aplicação às avessas que confronta a realidade resultante das audiências públicas: o governo Serra prioriza grandes obras de visibilidade eleitoral e, em contrapartida, freia investimentos nas áreas sociais.
A Secretaria da Educação, por exemplo, terá um aumento de 11,27% em relação a 2007, percentual menor, porém, do que o crescimento orçamentário geral, que subirá 12,02%. Com isso, sua participação no Orçamento total cai de 14,12%, em 2007, para 14,02%, em 2008.
A Secretaria da Saúde terá um crescimento ainda menor: de 6,56%. Desse modo, sua participação no "bolo orçamentário" cai de 10,11%, em 2007, para 9,61%, em 2008. A Secretaria da Segurança Pública terá um aumento de apenas 4,92% em relação a 2007. Portanto, também perderá participação, passando de 9,81%, em 2007, para 9,16%, em 2008. Somente nesses dois casos, a falta de recursos é estimada em mais de R$ 800 milhões.
Por outro lado, podemos observar que as secretarias dos Transportes e dos Transportes Metropolitanos terão seus orçamentos acrescidos em 33,7% e 43,84%, respectivamente.
Nessa mesma linha se inclui o aumento do orçamento da Secretaria da Administração Penitenciária, que subirá 27,51%.
A agenda eleitoral torna-se mais evidente quando notamos que, novamente, o Orçamento de 2008 será subestimado, a exemplo do ocorrido nos anos anteriores. Para 2007, foi estimado o valor de R$ 84 bilhões para o total do Orçamento, porém, até o final deste ano, esse número deverá superar os R$ 90 bilhões.
As projeções também apontam que, em 2008, entrarão para os cofres estadual entre R$ 101,2 bilhões e R$ 105,5 bilhões, e não os R$ 95 bilhões anunciados. Com isso, o governo amplia sua margem de remanejamento de recursos, prevista em mais de R$ 10 bilhões, sem necessidade de aprovação pela Assembléia Legislativa.
Vale destacar a participação organizada dos representantes dos funcionários públicos aposentados em praticamente todas as audiências realizadas, eles que estão sentindo no bolso os anos da política de bônus sem reajuste nos salários. Infelizmente, o arrocho salarial deverá continuar, já que as despesas com pessoal e encargos (pagamento da folha do servidor e aposentadoria) crescerão apenas 1,3%, enquanto as outras despesas correntes subirão 16,76%.
As demandas mais presentes, tanto no interior quanto nas regiões metropolitanas, foram os investimentos na saúde, principalmente no atendimento secundário, exemplificado na necessidade de construção de mais hospitais de referência e também na ajuda às santas casas.
Outra preocupação freqüente e que está sintonizada com o atual estágio de recuperação econômica do país é o pedido de mais cursos de formação técnica que atendam a demanda do mercado.
Nas regiões metropolitanas da Grande São Paulo e do ABCD, bem como em Campinas e na Baixada Santista, ficou evidente a necessidade de investimentos em saneamento básico, sobrando críticas à Sabesp, e também na área de moradia, principalmente aquela afeta às famílias de baixa renda. Sobre a segurança pública, foi reiterada a preocupação, constatada por pesquisa da Fundação Getulio Vargas, mais do que de investimentos no setor, de criar mecanismos de combate à corrupção policial.
As solicitações das regiões administrativas e metropolitanas serão transformadas em emendas parlamentares para que sejam incluídas no Orçamento de 2008, mas que terão que passar, antes, pelo crivo do governo estadual. Dessa vez, esperamos que as demandas sejam analisadas sob a luz da realidade do nosso Estado, que, apesar de ser o mais rico da Federação, enfrenta dificuldades que podem comprometer o seu futuro e que foram deixadas à margem na proposta governamental.


MÁRIO REALI, 50, arquiteto e urbanista, mestre pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, é deputado estadual de São Paulo (PT) e membro da Comissão de Finanças e Orçamento da Assembléia Legislativa.
ENIO TATTO, 47, contador, é deputado estadual de São Paulo (PT) e líder da minoria na Assembléia Legislativa.

Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br

Texto Anterior: TENDÊNCIAS/DEBATES
Rodrigo Maia: Democratas, sim, e daí?

Próximo Texto: Painel do Leitor
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.