São Paulo, quinta-feira, 12 de janeiro de 2006

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De quem é a amnésia?

ALBERTO GOLDMAN

Em artigo publicado nesta página no último dia 27, Henrique Fontana, líder do PT na Câmara dos Deputados, acusa o PSDB de estar sofrendo de amnésia. Vindo de um líder petista, tem um tom de ironia. Ao repetir as críticas feitas durante oito anos ao governo FHC, Fontana se omite de analisar e discutir as soluções que, segundo Lula e o PT, seriam assumidas para superar o que, segundo ele, seria a "implementação do projeto liberal-conservador" dos tucanos. Foi com um novo projeto (?) que venceram as eleições e, com ele, deveriam governar. Já se esqueceram?
Segundo ele, no "reinado" de FHC se impediu a instalação de CPIs para investigar graves denúncias, como favorecimento nas privatizações. Mas, aí, já no poder, por que não o fizeram? Claro, na oposição era apenas a tentativa de promover desgaste político. No governo, temem afastar os investimentos. O fato é que foi o governo atual que mobilizou céu e terra na tentativa de impedir a instalação das atuais CPIs em funcionamento. Sabiam por que deveriam impedi-las. Os resultados evidentes das investigações explicam tudo.
Curioso é que criticam as privatizações, porém trabalham para atrair capital privado para investir no setor elétrico, renovam os contratos do setor de telefonia, anunciam privatizações de rodovias, comemoram descobertas da Petrobras associada a empresas multinacionais e buscam dar financiamento privilegiado a empresas privadas por meio do BNDES. Foi com esse projeto que venceram as eleições? Não, foi o oposto! Esqueceram?
No período FHC, segundo Fontana, não teria havido proposições para uma reforma política de caráter estruturador e moralizador dos costumes políticos brasileiros. Errado! Tínhamos e temos, a começar pela defesa do sistema parlamentarista de governo. Aquilo que seria possível fazer, no atual período, o PT abdicou de levar adiante por pressão de seus partidos aliados "mensaleiros". Reféns destes, fugiu da raia à primeira ameaça.
No governo FHC, as taxas de juros eram elevadas. E o foram em momentos de crise internacional. E o que faz o PT em uma conjuntura internacional excepcionalmente favorável? Juros altos, crescimento pífio, dívida pública saltando, carga tributária em crescimento ano após ano. Culpam o FHC. Mas eles não tinham a solução para tudo? Não bastava tê-los no poder?


O líder do PT nos acusa de praticar o "denuncismo endêmico". Que cinismo! Não eram eles os arautos da ética na política?

Fontana se regozija por não precisar renovar o acordo com o FMI. E para que seria necessário? A balança comercial é superavitária em face das ações iniciadas na gestão FHC e do quadro de crescimento da economia mundial. Além disso, o Ministério da Fazenda do governo Lula faz, até com mais rigor, o papel do Fundo Monetário Internacional.
O líder do PT nos acusa de praticar o "denuncismo endêmico". Que cinismo! Ainda hoje o praticam, como sempre fizeram, contra nós. Não eram eles os arautos da ética na política? Por acaso, Roberto Jefferson, Valdemar Costa Neto, José Borba, Delúbio Soares, Marcos Valério, Duda Mendonça e outros réus confessos são da oposição? Em algum momento da história a direção partidária do PSDB se envolveu na organização de uma estrutura estatal de corrupção como a comandada pela direção nacional do PT?
O líder alardeia punições de corruptos por meio do que seria um trabalho independente da CGU, da Polícia Federal e do Ministério Público -e pasmem- "com apoio do presidente da República e do PT". Ora, só depois das denúncias descobriram que existem ou existiram tantos corruptos assim na estrutura pública. E se as CPIs, que o governo e os "mensaleiros" tentaram evitar, não tivessem se constituído?
Ainda assim, Ministério Público não é órgão do Executivo e, até agora, não percebemos nenhum empenho do governo em rastrear e descobrir a origem do dinheiro recebido por Duda Mendonça no exterior.
Pergunta o líder Fontana: "Qual a avaliação da oposição dos seus oito anos de governo?". A melhor resposta é o próprio governo Lula. Ao contrário do que apregoou durante a campanha, repetiu a agenda anterior, mas foi incapaz de avançar para responder às demandas de uma nova conjuntura. Manteve a austeridade fiscal, câmbio flutuante, metas de inflação, incentivo às exportações, porém perdeu a oportunidade de promover um crescimento econômico bem mais expressivo, o aumento nos investimentos produtivos e nos níveis de emprego ao manter por três anos os maiores juros reais do mundo e uma carga tributária em permanente crescimento.
Esbanjam mediocridade em áreas como educação e saúde, nas quais a desarticulação e a falta de criatividade os fazem retroceder os importantes passos do governo FHC. Mas o líder do PT segue a linha de seu mestre, o presidente Lula: "Antes de mim, era o dilúvio". No Brasil, redescoberto por Lula, bastaria vontade política. Esqueceram?

Alberto Goldman, 67, deputado federal, é líder do PSDB na Câmara dos Deputados e primeiro vice-presidente nacional do partido. Foi secretário de Estado da Administração (87-90) e ministro dos Transportes (92-94).
@ - comente@albertogoldman.com.br


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