São Paulo, segunda-feira, 12 de abril de 2004

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O PODER DO TRÁFICO

Passa o tempo , mudam os governantes, mas tudo permanece inalterado na rotina de violência dos morros e favelas do Rio de Janeiro. Na Semana Santa, o país acompanhou, aturdido, as imagens de mais uma batalha travada na antiga capital federal, desta feita na Rocinha e no Vidigal, na zona sul da cidade.
Curiosamente, ao mesmo tempo em que traficantes se enfrentavam e policiais ocupavam os morros, noticiava-se o lançamento de um romance no qual o autor confere tratamento ficcional a fatos que presenciou precisamente na Rocinha, como a existência de uma rede de conivência que une policiais, traficantes, líderes comunitários e ONGs.
Não é preciso especial discernimento para perceber que a questão está longe de se circunscrever a disputas de quadrilhas por pontos de droga. A presença do narcotráfico transcende os limites desses bandos e das comunidades carentes. Atinge setores da polícia e do poder público, numa ampla teia de interesses cujo nome é crime organizado.
Não há dúvida de que as quadrilhas de traficantes devem ser combatidas, embora essa seja uma luta inglória, enquanto persistirem outras situações que fomentam a formação desses grupos. A questão é complexa e não há solução simples nem alcançável em curto prazo. As Forças Armadas já foram mobilizadas, e o Exército já ocupou morros cariocas, sem que nada tenha, afinal, mudado.
Para ser equacionado, o problema exige algo raro no poder público brasileiro, que é a capacidade de desenvolver ações coordenadas em diferentes esferas. É essencial que os governos estaduais e federal se entendam. Mais do que isso, é preciso ter a coragem de buscar nos estratos menos miseráveis da população os elos mais fortes da corrente do narcotráfico. Sem atacar a lavagem de dinheiro e a corrupção que se dissemina pelas instituições, continuaremos condenados a presenciar batalhas entre policiais, bandos e chefetes, como as que se travam no Rio.


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