São Paulo, sábado, 12 de abril de 2008

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O Banco Central deveria aumentar os juros na próxima quarta-feira para conter a inflação?

SIM

Alta moderada do juro é salutar

CARLOS EDUARDO SOARES GONÇALVES

NA SEMANA que vem, o Copom (Comitê de Política Monetária) se reunirá mais uma vez para analisar a evolução do quadro econômico e, a partir daí, decidir o que fazer com a taxa de juros básica.
Olhando os dados dos contratos de juros nos mercados futuros, fica claro que os agentes econômicos atribuem probabilidade muito alta de que a Selic seja elevada, ficando a discordância restrita ao tamanho do ajuste.
Recentemente, o professor Delfim Netto disse não ver excesso de demanda na economia brasileira. Com a ironia de sempre, aventou que a única coisa em excesso no Brasil é a dengue.
Apesar de concordar com vários pontos levantados por Delfim Netto, como a crítica à visão de que o PIB potencial brasileiro tem um teto de expansão na casa de 3,5%, não me coaduno com a tese de ausência de excesso de demanda.
De fato, não é trivial a afirmação de que o crescimento forte levará à inflação acima da meta, visto que ela só estará correta se o crescimento se dever eminentemente a impulsos de demanda, que causam aumentos dos preços. Quando a economia cresce a reboque de ganhos de produtividade e investimentos, a inflação não é um problema, como nos mostra a experiência americana da segunda metade da década passada.
Assim, preocupa o fato de que a taxa de crescimento de vendas do varejo esteja rodando na casa dos 12% (em 12 meses). Isso porque "vendas" é uma medida quase pura de demanda.
A produção industrial, por sua vez, vem crescendo bem abaixo disso: 7%.
Outra variável que os economistas gostam de olhar para medir a "temperatura" da demanda é a expansão da quantidade de moeda na economia.
Até janeiro, o crescimento em 12 meses do agregado monetário chamado de M1 girou acima de 22% e apenas na ponta da série passou a situar-se abaixo de 20%. Não é pouco.
Por fim, a utilização da capacidade instalada da indústria não tem cedido nem mesmo em meio à boa leva de investimentos que temos testemunhado, situando-se em torno dos 83%. Em resumo, há sinais de descompasso entre oferta e demanda, sim.
Mas como pode a demanda crescer mais rápido que a produção sem que a inflação já tenha explodido em nossas faces? A resposta é simples: a conta está "fechando" via importações, que têm crescido vigorosamente.
Por enquanto, devido aos elevados preços internacionais dos bens que exportamos, esse influxo de bens importados não levou à depreciação cambial e, conseqüentemente, não gerou problemas inflacionários. Mas não se deve contar com essa saída "ad infinitum", pois em alguma hora o déficit afeta o câmbio.
Do lado oposto, o principal argumento daqueles contra a elevação dos juros é que a inflação acumulada em 12 meses está apenas muito ligeiramente acima da meta para 2008, e as expectativas de inflação dos agentes de mercado estão literalmente em cima da meta de 4,5%. Além disso, muito da pressão inflacionária vem da alta das commodities, e os juros domésticos mais altos não frearão a elevação de seus preços, que tem origem no forte crescimento da economia chinesa. Por que então subir os juros?
Primeiro, porque, ainda que a inflação esteja hoje em patamares comportados, é provável que a continuidade da pressão de demanda venha a comprometer, em algum momento adiante, o quadro favorável. Não é nada saudável esperar a inflação incorporar-se para só depois combatê-la.
Mais ainda, como a política monetária afeta as variáveis econômicas apenas com alguns trimestres de defasagem, é mais importante monitorar o cenário prospectivo da inflação do que o nível da inflação corrente.
Segundo, pois, apesar de não fazer sentido combater a alta dos preços das commodities, faz sentido impedir -via política monetária- que ela chegue a outros bens na economia.
Concluindo, vejo necessidade de um aumento de juros daqui até o fim do ano. Contudo, como o investimento tem sido bom e as importações têm dado conta do excesso de demanda, essa alta tende a ser moderada.


CARLOS EDUARDO SOARES GONÇALVES, doutor em economia, é professor de economia da FEA-USP (Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade) e autor do livro "Economia sem Truques".

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