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RUY CASTRO
País sem pianos
RIO DE JANEIRO - Notícia desta
semana alerta para um fato preocupante: a queda a quase zero no interesse pelo piano entre os jovens
brasileiros. Em vários Estados, concursos importantes, destinados a
formar futuros solistas, deparam
com um número insignificante de
inscrições. E não se trata de desinteresse pela música -porque outros instrumentos, talvez mais imediatos, continuam prestigiados.
O Brasil e o piano têm uma bela
história juntos. Os dois conquistaram seu espaço quase ao mesmo
tempo no século 19: o piano, sobre o
cravo; o Brasil, sobre a sua condição
de colônia. O próprio príncipe dom
Pedro era pianista. Em pouco tempo, o piano tornou-se um móvel
obrigatório nas nossas casas, tanto
quanto o toucador e a escarradeira.
Permitiu também que muitos escravos, que o aprenderam, levassem vida melhor.
Desde então, num país em que o
violão sempre pareceu onipresente,
a grande música, do ponto de vista
do compositor, passou decisivamente pelo piano. É só citar Chiquinha Gonzaga, Ernesto Nazareth,
Freire Junior, Zequinha de Abreu,
Sinhô, Ary Barroso, Custodio Mesquita, Alcyr Pires Vermelho, Vadico, Johnny Alf, Tom Jobim, Marcos
Valle, Francis Hime, Edu Lobo,
João Donato. E os arranjadores, os
solistas, os acompanhadores?
Um motivo para o declínio do
piano nas casas brasileiras pode ter
sido a verticalização das cidades
-não é fácil transportar um piano
para o 10º andar. Outro pode estar
no fato de que leva mais tempo para
formar um pianista do que um médico ou engenheiro, sem nenhuma
garantia de que um dia ele possa viver das pretinhas. Mas todo estudante de piano precisa chegar a
profissional? A educação musical,
por si, não deveria ser suficiente?
Tom Jobim me disse que o piano
fez o homem acabar de descer da
árvore. Mas talvez a árvore seja o
nosso destino.
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