São Paulo, Sábado, 12 de Junho de 1999
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Café requentado

CARLOS HEITOR CONY


Rio de Janeiro - É o que dá um mandato requentado como o de FHC. Tudo é requentado -são os próprios aliados do governo que se apegaram à idéia de que tudo o que está acontecendo é velharia. Os grampos do BNDES, por exemplo, são café requentado, pois desde novembro do ano passado se falava neles.
Se surgirem novas provas da compra de votos para a reeleição, o argumento já está pronto: há mais de dois anos se falou nisso, não passa de café requentado.
O mesmo será dito do Sivam, da Pasta Rosa, dos escândalos que pipocaram e continuam pipocando por aí. Tudo velharia, tudo anterior à Primeira Guerra Púnica. O caso mais recente é o da nomeação do novo chefe da Polícia Federal, acusado de ser torturador ou cúmplice da repressão durante o regime militar.
O governo classificou o assunto como café requentado. Digamos que amanhã ou depois, na afobação de sair de um problema para criar outro, FHC nomeie o capitão Wilson (o do Riocentro) para o cargo de ministro da Cultura -se houver pressão da base aliada, ele é capaz de coisas assim.
Evidente que, tirante os colunistas amigos do poder, que elogiarão o ato como a mais recente e fulminante manifestação da sabedoria presidencial, haverá grita na imprensa. Como? Nomear ministro da Cultura um oficial que ia jogar uma bomba num show de música popular, matando centenas de jovens?
Sabem-se de antemão a resposta e a desculpa: "Não há provas definitivas desse atentado, os indícios são de fonte suspeita, prevalece a versão oficial feita pelas autoridades competentes que inocentam o ex-capitão. No mais, é um assunto velho. Café requentado".
Ainda bem que é improvável a ressurreição dos mortos. Caso contrário, PC Farias ainda seria nomeado para o Banco Central. E se alguém reclamasse, alegando que PC Farias havia mantido um esquema de roubo e suborno, FHC diria ou mandaria alguém dizer que se tratava de café requentado.


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