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O novo programa de crédito educativo do governo beneficia os estudantes?
NÃO
Agiotagem educacional
RICARDO CAPPELLI
O fim da filantropia nas universidades
particulares suscitou debates sobre a
simbiose entre o Estado e o ensino privado no Brasil. De nossa parte, achamos um grande avanço acabar com a
generalização desse benefício. Já havia
algum tempo que denunciávamos que
a maioria das instituições beneficiadas
não exercia nenhum tipo de filantropia;
só usava o certificado para se esquivar
do recolhimento de impostos e, com isso, aumentar seus rendimentos, lesando toda a sociedade. Apesar de essa iniciativa ter nossa aprovação, é preciso
esclarecer alguns fatos.
A filantropia se generalizou nos últimos anos como política oficial do governo, que via em cada abertura de instituição filantrópica de ensino superior
uma fonte de financiamento de campanhas eleitorais e de votos no Parlamento. São notórios o poder do lobby do
ensino particular no Congresso e seu
peso na bancada governista.
A mudança na lei da filantropia, no
entanto, tem a ver com o ajuste fiscal,
que o governo fez por pressão do Fundo Monetário Internacional. Em 1998,
o Brasil pagou cerca de US$ 50 bilhões
em juros da dívida; neste ano, o pagamento pode chegar ao dobro desse valor. Boa parte dele sai de cortes de verbas nas áreas sociais e da extinção da
imunidade fiscal de entidades filantrópicas, com a qual o Executivo espera
arrecadar mais de R$ 2 bilhões, o equivalente a uma semana de juros.
Outro fator que precisa ser considerado é que a coerência de acabar com a
"pilantropia" não pode, por outro lado, inibir iniciativas de instituições que
fazem benemerência de fato, inclusive
porque o poder público se omite de
suas obrigações sociais e as transfere
para organizações assistenciais.
É preciso delimitar bem os campos.
Por isso, apoiamos projetos do Congresso que permitem que o total de bolsas de estudo concedidas pelas instituições possa ser descontado do imposto
devido -a cota patronal do INSS-,
independentemente de ser bolsa integral ou parcial. Há o perigo de evasão
em massa das universidades: ao acabar
com a filantropia e não permitir o abatimento das bolsas parciais, o governo,
demonstrando indiferença para com os
estudantes brasileiros, deu motivos para que as universidades anunciassem o
cancelamento dos subsídios aos alunos
carentes e o aumento das mensalidades. Isso consegue prejudicar todos de
uma só vez: os que tinham bolsas ficam
sem ajuda, e os que não tinham vão pagar mais pela anuidade escolar.
Se a intenção da medida fosse realmente moralizar o serviço público e,
consequentemente, a educação, o governo deveria não só permitir o desconto das bolsas como fiscalizar o aumento ilegal de mensalidades. Ao contrário: o Ministério da Educação não só
fechou os olhos para isso como autorizou reajuste de preços na reedição
(eterna) da medida provisória que rege
as mensalidades escolares. Com isso, o
MEC dificulta ainda mais o já restrito
acesso ao ensino superior. Não aceitamos reajuste sob o pretexto do fim da
filantropia. Se é verdade que a nova lei
inviabiliza as universidades, elas devem
abrir suas contas para uma auditoria da
comunidade e permitir que esta participe das decisões e busque soluções.
Não é possível que o MEC, diante desse drama, apresente como solução o
novo crédito educativo. Ele não é suficiente nem para atender os alunos que
recebiam bolsas das ex-universidades
filantrópicas, quanto mais para novos
financiamentos de estudantes da rede
privada que estão inadimplentes (cerca
de 35%). O ministério aumentou a taxa
de juros do crédito, de 6% para 12% ao
ano, e extinguiu o prazo de carência de
12 meses existente na regra anterior.
Agora, a pessoa passa a pagar logo depois de formada, mesmo que não tenha
conseguido emprego.
Para os ex-bolsistas das instituições
filantrópicas, o novo crédito é uma arapuca, já que antes eles recebiam bolsas
não-restituíveis e agora terão de fazer
seu ressarcimento à CEF. Com tantas
novidades, o crédito educativo deixa de
ser uma ajuda educacional para tornar-se uma operação de empréstimo
bancário, sob as regras do mais puro
sistema mercantilista. Será que o acesso
e a permanência no ensino superior
passam pela inauguração da agiotagem
educacional? Estamos convictos de que
não é esse o caminho, mas o ministro
Paulo Renato talvez possa explicar que
filosofia educacional é essa.
Ricardo Cappelli, 27, é presidente da UNE (União Nacional dos Estudantes) e aluno de informática da Universidade Estácio de Sá (RJ).
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