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FERNANDO RODRIGUES
País sem jeito
BRASÍLIA - Rápido no gatilho, Clóvis Rossi captou e comentou muito bem
ontem a notícia mais importante dos
últimos dias: o drama dos brasileiros
que fogem para o exterior em busca
de emprego. Três morreram em menos de dois meses.
O último foi o de Ricardo Luiz Ignacio. Morreu por causa do calor intenso no deserto do Texas.
A emigração ilegal de brasileiros é
uma das páginas mais tristes da história recente do país. São pessoas na
sua imensa maioria honestas. Querem trabalhar. Desesperançados, desistem do Brasil. Submetem-se a condições subumanas de vida.
No Japão, vi brasileiros cumprindo
jornadas de 15 horas por dia em uma
fábrica nos arredores de Tóquio. Em
Londres, no início dos anos 80, brazucas ilegais congelavam água numa
pequena forma do tamanho exato de
uma moeda de uma libra. O "dinheiro" de gelo servia para acionar o
aquecedor do local onde passavam a
noite -sim, o aquecedor funcionava
na base da moeda.
Em 1988, em Nova York, a cena
mais emblemática. Algemados pelos
pés e pelas mãos, um grupo de brasileiros foi levado pelas autoridades
norte-americanas até a 5ª Avenida,
onde estava o luxuoso consulado do
rico (sic) Brasil. Seriam deportados.
Na saída, já sem as algemas, alguns
saíram correndo. Escaparam.
Corri atrás de um deles. Era verão.
Calor manauara em Nova York. Alcancei-o dez quadras depois. Vinha
de Minas Gerais. Não sabia falar inglês, não tinha documentos, estava
com a roupa do corpo e nunca estivera fora de seu país. Encontrava-se só,
no meio de Manhattan. Como iria se
virar? Não seria melhor retornar ao
seu país? "O Brasil não tem jeito",
disse. Saiu correndo. Sumiu.
Agora, 16 anos depois, muito mais
brazucas tentam esse caminho. Alguns, os que ficamos sabendo, morrem no deserto. A manchete da Folha
de ontem dizia que deixar o dinheiro
no banco rende quatro vezes mais do
que investir em produção e na criação de empregos. Tem jeito, o Brasil?
No curto prazo, nenhum. Zero.
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