|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
CARLOS HEITOR CONY
Coisas maravilhosas
RIO DE JANEIRO - Indo para o Galeão, peguei um viaduto que ia dar
na Linha Vermelha. Lá de cima, vi
um campo de futebol, pequenino, desativado. Custei a reconhecer que
aquele era o estadinho do São Cristóvão, time pelo qual meu pai torcia,
acho que solitariamente, não conheci
outro torcedor dos chamados "alvos"
-a camisa do time era branca.
Só estive ali uma única vez, em
companhia de Mário Filho e Nelson
Rodrigues, para assistir a um jogo do
Fluminense contra o time local. Precisávamos daquela vitória, éramos
considerados um "timinho", tínhamos Didi, Orlando, Telê, Pinheiro,
Castilho, Carlyle, seríamos campeões
naquele ano, mas não convencíamos,
o empate seria um desastre, a derrota, letal.
O São Cristóvão, seguindo a tradição, era mais uma vez o lanterninha
do campeonato e, ainda por cima, estava sem goleiro. Convocaram às
pressas um marinheiro que tomava
conta dos barcos do clube (que, de
origem, era clube de regatas, meu pai
foi remador de um deles).
Chamava-se Mariano, estava gordo, cevado, parece que nunca jogara
futebol, mas acabou fechando o gol.
Nunca vi nada de mais extraordinário, opinião compartilhada por Mário Filho, que era tricolor disfarçado,
e por Nelson Rodrigues, que nem se
manifestou, ficou mamando um cigarro apagado o tempo todo e disse
um palavrão quando o jogo terminou empatado em zero a zero.
O Fluminense jogou os 90 minutos
dentro da área adversária, até Pinheiro, nosso monumental zagueiro
central, dava cabeçadas para o canto
do gol e o diabólico Mariano catava
todas.
Já contei aqui que tive um primo
que viu santa Terezinha do Menino
Jesus nuns bambuais que havia no
quintal de nossa casa. Em matéria de
coisas maravilhosas, acho que superei o primo vendo esse tal de Mariano, desengonçado como um orangotango de filme de terror da Republic
Pictures, pegando todas. Mário e Nelson já se foram. Pensei neles para não
renovar uma dor que nunca esqueci.
Texto Anterior: Brasília - Eliane Cantanhêde: Collor festeja Próximo Texto: Otavio Frias Filho: Imprensa livre Índice
|