São Paulo, segunda-feira, 12 de setembro de 2011 |
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TENDÊNCIAS/DEBATES Os desafios de um palco centenário MARCIA CAMARGOS
Inaugurado em 12 de setembro de 1911, o Theatro Municipal vinha colocar São Paulo no circuito das temporadas líricas internacionais. A partir daquele momento, as companhias operísticas, que antes faziam o trajeto Rio de Janeiro-Buenos Aires, dispunham de uma casa de espetáculos com os requisitos técnicos apropriados para suas grandes montagens. Saído das pranchetas de Ramos de Azevedo, o novo espaço possibilitava a expansão do núcleo originário da colina do colégio dos jesuítas para o outro lado do vale do Anhangabaú. A noite de abertura causou um congestionamento inédito. Conta-se que, dos 300 veículos então existentes na cidade, mais de cem dirigiram-se para lá. Erguido com recursos públicos, o teatro respondia aos anseios cosmopolitas da elite, que tinha no prefeito Antônio da Silva Prado seu maior representante. Também endossava o projeto de dotar a capital de equipamentos culturais condizentes com a sua vocação de metrópole emergente, na esteira de iniciativas como a Pinacoteca do Estado, regulamentada no mesmo ano. Inspirado na Ópera Garnier de Paris, modelo para a burguesia cafeeira, de estilo eclético com ornamentação renascentista clássica e barroca, o edifício oferecia 1.816 poltronas, número assombroso para uma população de 400 mil. Como registrou a imprensa da época, tudo para atestar, "na grandeza e magnificência de suas linhas arquitetônicas, a riqueza de São Paulo e assinalar uma nova fase, promissora dos mais fecundos resultados em nosso meio artístico e cultural". No contrafluxo do ufanismo, alguns criticavam o governo, mais empenhado em erguer um monumento do que um organismo vivo. Ao longo das obras, não houve, de fato, a preocupação em se formar uma orquestra, um coro ou um corpo de baile. Era apenas um prédio luxuoso para receber os grupos que aportavam com cenários, figurino, cantores e músicos. Com o tempo, e na medida em que a comunidade artística se estruturava, a situação foi mudando. Por iniciativa de Mário de Andrade, em 1935 criou-se o quarteto Haydn, embrião do atual Quarteto de Cordas da cidade. Depois, viriam o Coral Paulistano e os demais corpos estáveis. Em um século de existência, apresentou nomes de proa dos cenários nacional e estrangeiro e sediou eventos-chave da nossa história cultural, como a Semana de Arte Moderna e o Congresso Brasileiro de Escritores, em 1945. Suas escadarias serviram para demonstrações contra a carestia e a ditadura militar. Converteu-se em fundação pública logo após a terceira reforma, entre 2009 e 2011. No processo, resgatou os vínculos tradicionais com o Conservatório Dramático e Musical. A menos de duas quadras de distância, este será convertido em sala de música de câmara da praça das Artes, que vai abrigar os locais de ensaio e o lugar da memória, disponibilizando aos pesquisadores os acervos do conservatório, da discoteca Oneida Alvarenga e do próprio Theatro. Resta hoje ao Municipal centenário o desafio de reforçar a missão de centro lírico e erudito, enquanto procura atrair jovens com uma programação diversificada e popular. MARCIA CAMARGOS, doutora em história pela USP, é autora de "Theatro Municipal 100 anos, Palco e Plateia da Sociedade Paulistana" (no prelo). Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br Texto Anterior: TENDÊNCIAS/DEBATES João Grandino Rodas: Os vizinhos do Museu de Arte Contemporânea Próximo Texto: Painel do Leitor Índice | Comunicar Erros |
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