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CLÓVIS ROSSI
Entre a rua Wall e a rua
SÃO PAULO - Para, mais uma vez, contrariar a sabedoria convencional,
suspeito que o problema de um eventual governo do PT não vá ser o radicalismo que alguns setores suspeitam
estar escondido sob a pele de cordeiro
vestida pelo partido. Será, ao contrário, o excesso de moderação.
Posto de outra forma: se o PT quiser
agradar mais à rua Wall de Nova
York do que às ruas brasileiras, vai
quebrar a cara.
A menos que consiga provar que é
possível combinar a ortodoxia defendida pela rua Wall com a mudança
votada pelas ruas tupiniquins (se
76% votaram na oposição, não é, obviamente, para manter as coisas como estão, certo?).
Para começar, ganhe quem ganhar,
não terá à mão um instrumento anticíclico clássico, que é aumentar o gasto público em momentos de desaceleração da economia.
O FMI já deu aval para o projeto da
Comissão Européia que joga de 2004
para 2006 a obtenção do déficit zero,
o que mostra que não se trata de radicalismo, de violação de contratos, o
diabo. Trata-se de bom senso, mas só
está disponível para brancos, não para nós, pobres mulatinhos.
Aqui, como disse ontem Vinicius
Torres Freire, um dos meus diletos
chefes, "a princípio, não há alternativa a um regime de pão e água".
É até razoável e sensato que, "a
princípio", o PT dê mais atenção à
rua Wall que à rua brasileira que votou nele. Os tais mercados têm canhões de acionamento instantâneo
capazes de pôr um país de joelhos. Já
a rua demora para reagir.
Na Argentina, país em que o sangue, felizmente, ferve mais rápido, foram necessários três anos de recessão
para chegar ao "panelaço" que depôs
Fernando de la Rúa.
O diabo é que esse "pão e água" do
princípio pode condicionar o futuro
imediato, criando uma camisa-de-força que ponha um eventual governo do PT no caminho de De la Rúa.
Mas não por mudar o rumo, e sim
por incapacidade de fazê-lo.
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