São Paulo, domingo, 13 de fevereiro de 2005

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O FIM DA "ERA ROOSEVELT"

Há quatro anos, quando o governo Bush anunciou seu agressivo programa de cortes de impostos e começou a aumentar dramaticamente os gastos militares, muitos analistas alertaram para o perigo de que essas iniciativas se traduzissem em desequilíbrio das contas públicas. O risco era que, somado ao déficit das contas externas norte-americanas, o desajuste fiscal contribuísse para um acentuado enfraquecimento do dólar. A realidade, está claro, confirmou os prognósticos.
Alguns críticos, todavia, entre os quais o economista Paul Krugman, iam além. Em primeiro lugar, salientavam o caráter concentrador de renda dos cortes de impostos, que beneficiaram de maneira mais intensa as camadas ricas da sociedade. Em segundo lugar, alertavam para a possibilidade de que o expansionismo fiscal de Bush previsse uma ambiciosa agenda subjacente de reformas voltadas para o desmonte da rede de proteção social do Estado de Bem-estar em sua versão norte-americana.
O argumento desses críticos era que a administração Bush não desconhecia o impacto adverso que suas iniciativas teriam sobre a saúde fiscal do país. Pelo contrário: o enfraquecimento das finanças públicas seria o passo que antecederia uma posterior aprovação das reformas preconizadas pelas alas mais ortodoxas -e ultraliberais- do partido Republicano. O desequilíbrio fiscal, em grande parte justificado pela guerra ao terrorismo, caracterizaria uma situação de emergência que enfraqueceria as resistências dos parlamentares às propostas do Executivo.
Recebido de início com reservas por muitos analistas, por soar conspiratório, é provável que o argumento encontre agora maior acolhida. Pois a proposta de Orçamento recentemente apresentada, além de reconhecer a necessidade de dar início a um ajuste fiscal, sugere que ele seja feito por meio de cortes agressivos de gastos em programas sociais, mantendo intocadas -ou ainda maiores- as despesas militares.
O símbolo dessa ofensiva é o desejo da Casa Branca de privatizar em parte o sistema de Previdência dos EUA -medida que, de resto, tem sido debatida e implantada em diversos países. Tornando a polêmica proposta mais palatável, o grande volume de recursos fiscais requeridos para financiar a transição para o novo regime previdenciário não foi incluído na proposta de Orçamento, a exemplo dos gastos militares extras com o Iraque e o Afeganistão.
Essas omissões deixam dúvidas quanto ao real empenho do governo Bush em promover um rigoroso ajuste fiscal. O que está claro é o propósito do presidente de minar os princípios de atuação do Estado lançados pelo presidente Franklin Roosevelt, no bojo do "New Deal", quando os EUA procuravam superar a mais grave crise de sua história -a Grande Depressão de 1929.


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