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São Paulo, terça-feira, 13 de maio de 2003

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ELIANE CANTANHÊDE

A onda budista

BRASÍLIA - Na ótima entrevista de domingo à Folha, o ministro Luiz Gushiken citou um princípio budista: "Não mintas, mas não reveles a verdade em momento inoportuno".
Princípio válido para qualquer governo, de qualquer credo ou sem credo nenhum, mas especialmente atual agora, quando se fala em "fase 2" ou a "segunda onda" na economia.
Os "políticos" (que no governo FHC eram os "desenvolvimentistas") defendem aliviar os juros e a indução do crescimento -os manjados investimentos em exportações, em pequenas e médias empresas e em áreas estratégicas. Quem já não ouviu falar nisso? E quem pode ser contra?
Do outro lado, estão os "técnicos" (no governo FHC, eram os "financistas"), dizendo-se dispostos a fazer qualquer coisa para não fazer nada. Ou seja: não fazer marola. Significa manter juros altíssimos para conter a inflação e segurar investimentos.
Os "políticos" alardeiam a possibilidade da "fase dois" e da "segunda onda", o que agrada não só a Lula como à petezada e ao eleitorado em geral. Fica a sensação de que, tá vendo, o governo Lula não é igual ao de FHC. O Brasil vai crescer 3,5% ao ano, depois 7%, 30%, quem sabe 300%? É uma forma de gerar otimismo, não revelando a verdade.
Já os "técnicos" dizem que não vão mexer em nada e acabou. Também uma forma de não revelar a verdade para manter a aliança do mercado.
Onde entra o budismo? No jogo de cena, porque todos eles pensam e querem a mesma mágica -estabilidade e crescimento- e ficam falando, falando, mas não revelam a verdade: entre querer e poder, continua havendo uma boa distância.
Na verdade, políticos, técnicos, empresários e trabalhadores querem e discutem as duas coisas: que a macroeconomia continue estática para afastar riscos e que a microeconomia seja capaz de induzir ao crescimento. Tanto quanto quis o governo FHC.
Parece bom e simples (ou simplista) demais para ser verdade. Por enquanto, está mais para budismo do que para realismo.


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