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ELIANE CANTANHÊDE
A onda budista
BRASÍLIA - Na ótima entrevista de domingo à Folha, o ministro Luiz Gushiken citou um princípio budista:
"Não mintas, mas não reveles a verdade em momento inoportuno".
Princípio válido para qualquer governo, de qualquer credo ou sem credo nenhum, mas especialmente atual
agora, quando se fala em "fase 2" ou
a "segunda onda" na economia.
Os "políticos" (que no governo FHC
eram os "desenvolvimentistas") defendem aliviar os juros e a indução
do crescimento -os manjados investimentos em exportações, em pequenas e médias empresas e em áreas estratégicas. Quem já não ouviu falar
nisso? E quem pode ser contra?
Do outro lado, estão os "técnicos"
(no governo FHC, eram os "financistas"), dizendo-se dispostos a fazer
qualquer coisa para não fazer nada.
Ou seja: não fazer marola. Significa
manter juros altíssimos para conter a
inflação e segurar investimentos.
Os "políticos" alardeiam a possibilidade da "fase dois" e da "segunda
onda", o que agrada não só a Lula
como à petezada e ao eleitorado em
geral. Fica a sensação de que, tá vendo, o governo Lula não é igual ao de
FHC. O Brasil vai crescer 3,5% ao
ano, depois 7%, 30%, quem sabe
300%? É uma forma de gerar otimismo, não revelando a verdade.
Já os "técnicos" dizem que não vão
mexer em nada e acabou. Também
uma forma de não revelar a verdade
para manter a aliança do mercado.
Onde entra o budismo? No jogo de
cena, porque todos eles pensam e
querem a mesma mágica -estabilidade e crescimento- e ficam falando, falando, mas não revelam a verdade: entre querer e poder, continua
havendo uma boa distância.
Na verdade, políticos, técnicos, empresários e trabalhadores querem e
discutem as duas coisas: que a macroeconomia continue estática para
afastar riscos e que a microeconomia
seja capaz de induzir ao crescimento.
Tanto quanto quis o governo FHC.
Parece bom e simples (ou simplista)
demais para ser verdade. Por enquanto, está mais para budismo do
que para realismo.
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