|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
TENDÊNCIAS/DEBATES
O Brasil está preparado para continuar
crescendo a uma taxa de 6%?
SIM
Para perder o medo de crescer
ANTONIO CORRÊA DE LACERDA
TALVEZ O maior risco para a continuidade do crescimento da
economia brasileira atual não
sejam a incerteza do cenário internacional ou mesmo os gargalos internos. O grande desafio é livrar-se de
falsos dilemas e comprometer todos,
governo e agentes econômicos, com o
"espírito do crescimento".
A nação convive com um imenso
"déficit" social. A cada ano, 1,8 milhão
de novos trabalhadores procuram o
seu primeiro emprego, nem sempre
com sucesso. Há também uma dívida
com os cerca de um quinto dos jovens
entre 17 e 24 anos que permanecem
desempregados, apesar da reativação
da economia.
O crescimento se constitui em um
imperativo para um país com as características brasileiras. Não que a expressão quantitativa do crescimento
seja suficiente para consubstanciar a
melhora qualitativa do desenvolvimento. Mas este não se realiza sem
aquele, sendo, portanto, uma condição necessária.
A análise econômica convencional
tem se pautado nas questões que envolvem as restrições ao crescimento
econômico brasileiro. A idéia do PIB
potencial, nível a partir do qual adviriam pressões inflacionárias, é bastante questionável. Primeiro, porque
se revela tautológica. Como as decisões da política econômica se pautam
em um "teto" para o crescimento, esse se transforma em uma profecia auto-realizável.
Segundo, porque os indicadores referentes ao índice de ocupação da indústria precisam ser vistos com cuidado. Eles partem das respostas das
empresas, que tendem a adequar a
sua capacidade de produção, incluindo o uso de turnos de produção, no intuito de atender à demanda esperada.
Da mesma forma, investimentos são
programados e realizados com base
na expectativa de demanda.
Os dados, tanto a formação bruta de
capital fixo, que vem crescendo
16,2%, quanto os levantamentos de
intenções de investimentos, corroboram a visão de que não há desequilíbrios entre oferta e demanda à frente.
Esses aspectos precisam ser levados em conta na fixação das taxas de
juros, na regulação creditícia e demais decisões de política econômica.
Nesse ponto, o risco é que o exagero
na elevação dos juros, antes que tempestivo, seja açodado. Também é preciso evitar que, em nome da parcimônia, se sucumba à pusilanimidade, a
característica dos fracos.
Temos uma meta rígida de inflação,
mas pouco compromisso com o desenvolvimento. A situação vigente leva a um certo "conforto". Para o governante, os resultados do crescimento, ainda que aquém do necessário, dão uma falsa satisfação do "dever
cumprido", quando comparado ao
passado pregresso. Os elevados índices de aprovação do governo confirmam essa hipótese (é a economia, estúpido!). No "mercado", forma-se um
pseudoconsenso em favor de decisões
de cunho conservador.
A garantia de que o país possa crescer aceleradamente, superando gargalos sem gerar pressões inflacionarias, é estimular investimentos por
meio de um ambiente favorável. Isso
inclui não só juros mais baixos, câmbio competitivo, adequação tributária, melhora das condições de logística e infra-estrutura etc., mas também
maior determinação em políticas de
competitividade.
Mas não haverá um dia "d" a partir
do qual o país estará pronto para crescer. Trata-se de processo, do qual o
crescimento é parte integrante. Assim como a poupança é resultado do
efeito multiplicador dos investimentos, e não um pré-requisito.
O governo precisa fazer a sua parte,
melhorando a eficácia da gestão dos
recursos públicos, garantindo a estabilidade e a clareza do ambiente regulatório e realizando os investimentos
que lhe competem.
Para o setor privado, o que desperta
de fato o "espírito animal" dos empresários é, além das condições já mencionadas, uma percepção firme de aumento continuado da demanda. Curiosamente, a despeito da complexidade que envolve o tema, o que viabiliza o crescimento é mesmo o desejo
de crescer!
ANTONIO CORRÊA DE LACERDA , doutor pelo Instituto
de Economia da Unicamp, é professor doutor do Departamento de Economia da PUC-SP e co-autor, entre outros livros, de "Economia Brasileira" (Saraiva).
aclacerda@pucsp.br
Texto Anterior: TENDÊNCIAS/DEBATES Carlos Eduardo Soares Gonçalves: Bom, mas efêmero Próximo Texto: Painel do leitor Índice
|