São Paulo, domingo, 14 de março de 2004

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O NOVO MODELO ELÉTRICO

Nos últimos cinco anos, o Brasil passou por dois apagões e um racionamento compulsório de 20% na demanda de eletricidade, com graves conseqüências para o consumidor, as empresas e o desenvolvimento econômico do país. Essas crises demonstraram que o modelo desenhado durante o governo Fernando Henrique Cardoso, fortemente ancorado em princípios de mercado, apresentou falhas de planejamento e coordenação.
Após intensas negociações entre Executivo, Legislativo e empresas públicas e privadas, foi votado na semana passada o novo arranjo institucional para o setor. Os equívocos do passado certamente contribuíram para que o pêndulo oscilasse agora na direção oposta: no novo ordenamento, o Estado assume papel mais relevante do que no anterior. O Ministério de Minas e Energia recobra a capacidade de formulação e implementação de políticas, sem, no entanto, eliminar as funções fiscalizadoras e mediadoras da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).
Uma das principais inovações foi a criação de uma espécie de bolsa, a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE). As distribuidoras somente poderão comprar energia por meio de leilões promovidos por esse órgão. Acatadas as propostas, serão firmados contratos bilaterais de suprimento entre as geradoras e as distribuidoras, com prazos não inferiores a cinco anos, o que poderá reduzir a exposição dos investidores às oscilações de curto prazo. A tarifa cobrada do consumidor resultará da média dos preços da energia hidrelétrica e da térmica.
Já a expansão do sistema, ou seja, a implantação de novas usinas e linhas de transmissão, também ocorrerá mediante a realização de leilões, mas em outro fórum. Eles serão promovidos pela Aneel, a partir de estudos da Empresa de Pesquisa Energética. Vencerá o grupo econômico (admite-se a parceria entre empresas públicas e privadas) que oferecer a menor tarifa. Os vencedores firmarão contratos de longo prazo (15 a 20 anos) para atender a expansão do mercado das distribuidoras de energia.
Esses contratos oferecem a segurança de que haverá venda de eletricidade, o que permitirá às empresas utilizar a garantia dos ganhos futuros (contas de luz) para obter recursos financeiros a taxas mais razoáveis e viabilizar o empreendimento.
Nas negociações no Congresso, foram ainda introduzidas regras que diminuem as incertezas dos investidores. Em caso de estiagem, por exemplo, haverá a possibilidade de que as tarifas sejam reajustadas.
Formatou-se, portanto, um sistema híbrido, que reúne planejamento estatal e mecanismos de mercado, com uma matriz energética dupla, hidráulica e térmica. A intenção é hierarquizar o planejamento de curto, médio e longo prazos para garantir o suprimento de energia com as tarifas mais baixas possíveis e criar condições para novos investimentos.
São objetivos acertados. No entanto, dada a extrema complexidade do setor, é difícil antecipar os resultados das novas regras. As próximas licitações deverão ser um bom termômetro para medir sua eficácia.



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