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RUY CASTRO
Motivo e pretexto
RIO DE JANEIRO - Uma enquete
com 1.400 cientistas, realizada pela
revista britânica "Nature", revelou
que 20% dos membros das comunidades acadêmicas internacionais
usam estimulantes para "aumentar
a capacidade de concentração" e
"melhorar o desempenho intelectual". O mais popular seria o metilfenidato Ritalin. Os ditos usuários
não estariam preocupados com os
efeitos indesejáveis desses medicamentos controlados.
Como se trata de cientistas, o uso
de tais drogas já vem cercado de justificativas. Esse uso seria "instrumental" e destinar-se-ia apenas a
permitir-lhes passar noites em claro na busca de soluções para problemas, esses, sim, relevantes. Supõe que os cientistas, pelo conhecimento adquirido, estariam infensos
às conseqüências que afetam os
mortais pelo abuso repetido, ou seja, dependência, loucura e morte.
Na verdade, muitos cientistas são
chegados a estimulantes porque,
podendo auto-receitar-se, têm fácil
acesso a eles. Pelo mesmo motivo,
há uma incidência de dependência
de morfina entre médicos -apenas
porque, na maioria dos casos, basta-lhes tirar a chave do bolso e abrir
um armário para consegui-la.
Da mesma forma, é acima da média o grau de alcoolismo entre padres. O vinho da missa, que provoca
apenas a possibilidade de úlcera ou
diabetes em alguns, leva outros a
formar hábito e a tomá-lo entre
uma missa e outra ou o dia todo. E
não é que os jornalistas tenham
mais motivos para beber do que outras categorias -apenas saem tarde
do serviço e, para desligar, passam
no botequim antes de ir para casa.
Com o tempo, alguns já ficam direto no botequim.
No começo, há sempre um motivo para se usar esta ou aquela droga.
Instaurada a dependência, o motivo deixa de ter importância e se torna apenas um pretexto para se continuar usando a droga.
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