São Paulo, quarta-feira, 14 de setembro de 2011

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Editoriais

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Sem remédio

Como efeito colateral da crescente exposição de pacientes a uma ampla gama de medicamentos, torna-se cada vez mais frequente que fármacos testados e indicados para certo tipo de moléstia se revelem benéficos no combate a problemas distintos, que não haviam motivado o desenvolvimento original da droga.
É bem-vinda a descoberta de que um colírio contra glaucoma, por exemplo, possa ter efeitos terapêuticos em portadores de vitiligo; ou de que antidepressivos contribuam para combater tabagismo ou dor crônica.
No mais recente caso de prescrição alternativa, um remédio lançado em 2009 para o tratamento do diabetes tipo 2 tem sido usado, com sucesso, como emagrecedor. A liraglutina, vendida sob o nome comercial de Victoza, atua no cérebro e no trato digestivo, reduz a fome e aumenta a sensação de saciedade. Permite, assim, a perda de peso sem grandes sacrifícios.
Tamanha promessa de bem-estar fez com que muitos médicos e pacientes abandonassem a necessária cautela na indicação e no uso de tratamento ainda experimental -uma vez que os riscos à saúde dele decorrentes ainda não foram devidamente testados. A substância, cujas injeções custam cerca de R$ 500 por mês, já está em falta em farmácias.
Enquanto não se concluem novos estudos sobre os riscos e os benefícios de tratamentos alternativos, agências de vigilância sanitária nos EUA, na Europa e no Brasil costumam conceder algum grau de discricionariedade aos médicos no chamado uso "off-label" -aquele que não está previsto em bula- dos medicamentos.
Esse tipo de prescrição se justifica -pois não raro reverte em benefícios importantes-, desde que ela seja criteriosa. Nem sempre tem sido este o caso no uso recente da liraglutina no Brasil. Fez bem a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), portanto, ao emitir um alerta sobre os riscos de seu consumo para outros fins que não o do combate ao diabetes.
Feito o alerta público, é de esperar que médicos que administram o tratamento de maneira indiscriminada sejam responsabilizados, no futuro, caso se constatem prejuízos à saúde de seus pacientes. Mas a cautela deveria guiar, sobretudo, as escolhas das pessoas que buscam soluções imediatistas para problemas de saúde -em especial para aqueles que não conotam urgência.
Um pouco de paciência para aguardar resultados de novas pesquisas pode evitar que se tornem, elas próprias, cobaias humanas.


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