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São Paulo, sábado, 15 de fevereiro de 2003

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Parlamentares petistas que votarem contra decisões do partido deverão ser punidos?

NÃO

Democracia é fundamental

ANA JÚLIA CAREPA

O PT é um partido radicalmente democrático. Nascido na luta social, no confronto com a ditadura militar e na crítica ao stalinismo e à social-democracia, o PT tem na democracia tanto um valor interno como uma proposta para a sociedade. Da luta, nós construímos o compromisso de transformar a cruel realidade do capitalismo periférico. Do confronto com a ditadura, construímos a defesa da liberdade e da participação popular nos destinos do país. Da crítica aos modelos autoritários, construímos uma concepção democrática de socialismo e um partido com direito a tendências, com debate, com vigor militante e com unidade.
Para nós, portanto, democracia interna e democracia como proposta são indissociáveis. Em um país periférico, em meio a uma ordem antidemocrática e enfrentando uma das piores situações de desigualdade socioeconômica, o PT cresceu, fortaleceu-se, tornou-se governo em municípios e em Estados e firmou-se como o maior partido de esquerda da América Latina. Agora, tendo conquistado a Presidência da República, o PT tem o desafio de fazer avançar qualitativamente a democracia no Brasil e, ao mesmo tempo, fazer avançar a sua própria democracia interna. Essa é a condição básica para enfrentarmos os imensos desafios que temos pela frente.
O neoliberalismo, de Collor a FHC, legou-nos um país mais dependente economicamente e menos soberano politicamente. Com mais concentração de renda e miséria absoluta. Os avanços democráticos, duramente conquistados, foram sempre ameaçados e tolhidos. Quem não se lembra das ameaças do megaespeculador Soros, que queria caçar o direito soberano do povo brasileiro de escolher seu presidente? Ou dos Estados Unidos, que tentam nos obrigar a pensar que não há outro caminho no mundo, senão a submissão ao seu império? Ou ainda do FMI, que nos impõe uma política econômica que leva a mais desemprego e a maior subordinação às finanças internacionais? Essas ameaças, naturalmente, não cessaram. Vencemos uma grande batalha pela democracia e pela soberania com a eleição de Lula. Mas muitas outras estão por vir. A luta apenas começou.
É dentro desse contexto que temos de compreender e saber como resolver os impasses que têm surgido neste início de governo. O debate que hoje existe em amplos setores partidários sobre a política econômica do nosso governo é democrático e saudável. Esse debate acontece não só entre os que a imprensa rotulou de radicais mas também entre vários economistas do PT, que não têm ligação com qualquer grupo dito radical, e com vários outros setores do partido. Lula foi eleito com o sentimento da mudança e tem reafirmado isso em todos os seus discursos. Como superar o modelo neoliberal, que produziu recessão e desemprego, aumentou nossa vulnerabilidade externa e foi amplamente rechaçado nas urnas? Esse é um desafio para o PT, para os aliados e para a sociedade.
Acredito que, ao reafirmarmos a resolução do programa de governo de Lula, no 12º Encontro Nacional do partido, quando ficou estabelecida a diretriz de ruptura com o modelo neoliberal, estamos reafirmando retoricamente não apenas uma deliberação do fórum maior do partido mas a absoluta crença de que só é possível construir um modelo de desenvolvimento que recoloque o Brasil no caminho do crescimento econômico e que gere os empregos necessários, se este modelo neoliberal, gerador de desemprego, recessão e submissão, amplamente rechaçado nas urnas, for radicalmente mudado. A polêmica que está instaurada é como vamos fazer esse debate. Particularmente, creio que o melhor caminho seja o debate interno, e não o debate pela imprensa. Acredito que o PT, que tem reafirmado a sua democracia interna para reafirmar a democracia na sociedade, sempre tenha garantido o direito ao debate de idéias. Por isso é necessário e urgente que o façamos.
Nós, que apoiamos e defendemos o governo, precisamos debater para que seja implementada uma transição de fato para um outro modelo econômico, que atenda o clamor das urnas.
Portanto aprofundar o debate democrático sobre como viabilizar um programa de governo que defende uma política que possa trazer crescimento econômico, geração de empregos e mais qualidade de vida é o desafio colocado para todos nós. Essa é uma polêmica que vai além do próprio PT. Buscar meios de democratização do debate e das decisões, de modo que a participação incorpore os cidadãos diretamente. Cabe ao PT essa grande responsabilidade nesse processo, que exige mais democracia partidária, mais partido. Sabemos debater com respeito, sabemos valorizar as diferenças e construir nossa unidade. O momento não de é punições, é de diálogo. Sei que, além de mim, muitos querem trabalhar apaixonadamente para que este governo dê certo, pois sabemos que esta é a chance para que o Brasil dê certo. Vamos vencer mais este desafio.


Ana Júlia Carepa, 45, bancária e arquiteta, é senadora pelo PT-PA.


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