São Paulo, sexta-feira, 15 de setembro de 2006

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ELIANE CANTANHÊDE

Parece, mas não é

BRASÍLIA - Chávez pensa que é Simon Bolívar, e Evo Morales pensa que é Chávez. Mas uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa.
Chávez tem a Venezuela, o petróleo, uma popularidade testada sucessivamente e uma personalidade militar. Tem força. Morales tem a Bolívia, o gás, uma popularidade ainda movida a esperança e uma personalidade indígena. É frágil.
A Venezuela é a quinta produtora de petróleo do mundo, já a Bolívia é o país mais pobre da América do Sul. Outra diferença fundamental é que Chávez compra aviões e fuzis russos, mas só mira sua artilharia verbal contra os EUA, mantendo intactos todos os contratos com o país do "demônio" Bush.
Já Morales não tem aviões nem fuzis e dispara sua fúria anti-imperialista em duas direções: retoricamente, contra os EUA; na prática, explodindo relações e contratos com o Brasil. Seu alvo predileto é a Petrobras, o que é perigoso e pode ter um efeito devastador para a Bolívia. Afinal, do que adianta ter gás se não há empresas para explorá-lo? E quem, em sã consciência, está disposto a investir na Bolívia hoje?
Contra o governo Bush, Morales atira palavras, acusando um "complô" ou uma "conspiração" de Washington contra a Bolívia. Mas palavras não mordem. O que ele faz com a Petrobras, sim, tira pedaço.
Primeiro, Morales nacionalizou a exploração do gás. Agora, assume as refinarias sem pagar nada, o que equivale a expropriação (lembra do termo?). A Petrobras passa de dona a mera operadora do seu próprio empreendimento. Isso tem custo alto para a Petrobras, para o Brasil e para Morales, que se encaixa cada vez menos no perfil de Chávez e mais no de Quixote.
O governo brasileiro continua perplexo. A área técnica esperneia, mas a política (aí incluído o Itamaraty) não tem a menor idéia do que dizer e do que fazer com o "companheiro" abusado. Um Chávez não era pouco. Um e meio é demais.


elianec@uol.com.br

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