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AVENTURA SEM FIM
Iraquianos de todas as etnias e
grupos religiosos vão hoje às urnas para escolher o primeiro Parlamento sob a égide da nova Constituição do país. Os deputados eleitos indicarão o primeiro governo não-interino pós-Saddam Hussein. Trata-se
de um passo importante no difícil caminho da criação de um Estado democrático. Mas o pleito vem cercado
de tamanha violência -e são tantas
as incertezas quanto ao futuro- que
é difícil acreditar numa súbita mudança para melhor.
Ao que tudo indica, o eleitor vai votar segundo considerações étnicas e
religiosas. Árabes xiitas (60% da população) deverão votar em árabes xiitas, divididos entre os partidos islâmicos e os mais seculares; árabes sunitas (20%) escolherão árabes sunitas; e curdos (20%) sufragarão curdos. Mesmo assim, não deverá emergir nenhuma maioria clara, até porque o campo xiita -a exemplo dos
demais- está dividido em facções.
A participação dos sunitas, que haviam boicotado a eleição para a Assembléia constituinte, é uma boa notícia, mas não basta para apagar as
profundas divisões que rasgam o
país. Ao contrário, é até possível que
o pleito as acentue.
Para os EUA, a formação do novo
governo ofereceria, em tese, a oportunidade para decretar vitória e encerrar essa aventura que não deveria
ter começado. Mas o risco de que a
retirada se revele um fator de agravamento do conflito deverá adiá-la.
Num cenário extremo, sem a presença militar dos EUA no Iraque, o Irã
poderia ficar tentado a intervir em favor dos xiitas, o que levaria países
árabes de maioria sunita a auxiliar
seus correligionários. Para evitar a
criação de um Estado curdo independente -o pior pesadelo de Ancara-, a Turquia poderia despachar
seus tanques para o norte do Iraque.
Seria ótimo se o pleito de hoje representasse o começo do fim das
piores agruras dos iraquianos. Mas é
preciso muito otimismo para crer
nisso. A única certeza nesse conflito
é que poucas vezes a história viu o líder da maior potência mundial cometer um erro tão atroz.
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