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O governo federal deve renegociar as dívidas dos Estados?
SIM
Resgatar o pacto federativo
OLÍVIO DUTRA
Antes de examinar a justeza da mobilização dos governadores em torno das
dívidas dos Estados, é preciso que a sociedade brasileira entenda uma questão
central nesse debate. A maior parte da
dívida negociada com a União é constituída de juros recentes sobre dívidas
mobiliárias dos Estados. Portanto é
produto do modelo econômico adotado pelo atual governo federal, que
mantém os juros altos para garantir os
lucros dos capitais flutuantes que lastreiam o Plano Real.
No caso do Rio Grande do Sul, a dívida mobiliária cresceu de R$ 3,3 bilhões
para R$ 8,8 bilhões em quatro anos.
Portanto o governo federal tem responsabilidade pelo descontrole das dívidas dos Estados e, como tal, deve estar aberto ao debate que queremos desencadear. Os termos da renegociação
anterior não são favoráveis aos Estados, como sustentam seus defensores.
O argumento de que ela livra o pagamento de juros de mercado equivale a
tirar da sala o bode -ou seja, o juro
elevado- que o próprio governo federal colocou. No caso gaúcho, dívida é
impagável nesses moldes. O Estado
vem operando com um déficit anual de
cerca de R$ 1 bilhão, só coberto pela
receita das privatizações. O acordo determina o pagamento de parcelas equivalentes a 13% das receitas líquidas
que, somadas com as outras dívidas extralimite, comprometeriam só este ano
mais de R$ 800 milhões.
Ao mesmo tempo em que impõe o
pagamento de parcelas mensais fora da
realidade, a União vem sistematicamente retirando receitas dos Estados
com medidas como a Lei Kandir, que
desonera de ICMS as exportações de
produtos semi-elaborados, e o Fundo
de Estabilização Fiscal (FEF), outra vez
prorrogado pelo pacote pós-eleitoral.
Essas medidas e o corte de despesas
previsto no pacote retiram R$ 546 milhões por ano dos cofres gaúchos.
Nosso governo tem um projeto que se
opõe ao modelo neoliberal. Queremos
um Estado ágil, eficiente, executor de
políticas de desenvolvimento e capaz
de dar respostas às demandas sociais.
No entanto, o modelo de renegociação
induz a um Estado mínimo, esvaziado,
desmilinguido, cada vez mais ausente
da vida do cidadão.
Flagrantemente, a negociação viola o
pacto federativo consagrado na Constituição de 88, como na cláusula que permite a retenção de recursos do Fundo
de Desenvolvimento dos Estados em
caso de inadimplência. Outras cláusulas amarram os governos estaduais ao
projeto de privatizações, impõem o arrocho salarial dos servidores, reduzem
os investimentos públicos, inviabilizam programas de combate à exclusão
social e impedem os Estados de manterem suas instituições bancárias.
Novamente cito o exemplo gaúcho. A
renegociação assinada pelo governo
anterior determina que, caso o Banrisul não seja privatizado, a parcela subirá de 13% das receitas líquidas a um
percentual que pode chegar a 17%. Portanto tenta forçar a venda do banco estadual, que, no nosso projeto, cumprirá uma função estratégica fundamental
de financiar projetos voltados às pequenas e médias empresas, de apoio à
agropecuária, de acesso à terra e à moradia, de combate ao desemprego e à
miséria.
Mas também há questões entre nós,
os governos estaduais, que devemos
tratar com seriedade e autocrítica. Não
é mais possível conviver com a nefasta
guerra fiscal, que nos coloca uns contra
outros e que cria um confronto insano
por empresas privadas alimentado por
receitas públicas.
Lembro que o governo que nos antecedeu ofertou à Ford e à GM empréstimos privilegiados, que podem custar
R$ 5 bilhões ao Estado. Vamos lutar
para fortalecer o Confaz, o foro dos secretários de fazenda, como regulador
das políticas de incentivos, colocando-as em padrões socialmente justos.
É urgente recompor o pacto federativo quebrado pela própria União na forma como trata a dívida e nas constantes
medidas de renúncia fiscal. Mas buscamos principalmente estabelecer no país
um clima de debates sobre questões
que interessam a todos, mas que vinham sendo tratadas de forma unilateral. Defendemos o desenvolvimento
auto-sustentável dos Estados, que potencialize os governos como instrumento da cidadania para enfrentar a
crise e qualificar a vida das pessoas. Para isso, queremos construir uma relação solidária que integre o país e garanta um futuro digno e justo para todos
os brasileiros.
Olívio Dutra, 57, é governador do Rio Grande do Sul
pelo PT.
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