São Paulo, segunda-feira, 16 de fevereiro de 2004

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FERNANDO RODRIGUES

Ciclo político padrão

BRASÍLIA - O caso do assessor do ministro José Dirceu pedindo propina a um bicheiro exemplifica a padronização do ciclo político no Brasil.
O primeiro ano de governo é sempre preservado, não importa quem seja o presidente. O escândalo atual é de 2002. Apareceu agora, quase 14 meses depois da posse de Lula.
Crise instalada, há um roteiro padrão a ser seguido. Primeiro, vem a demissão do envolvido.
Em seguida, governo e oposição fazem um jogo de empurra. O Planalto afirma ter sido apanhado de surpresa. Diz que a Polícia Federal e o Ministério Público cuidarão do assunto. A oposição começa a coletar assinaturas para uma CPI.
O terceiro capítulo da novela tem a ajuda da mídia chapa-branca. Alguns noticiários de TV evitam dizer, orwellianamente, que o assessor demitido era ligado ao ministro José Dirceu. No Congresso, o Planalto pratica fisiologia. Impede a instalação de uma CPI. O tempo trabalha a favor da operação abafa.
O "script" pode ter uma ou outra alteração. Por exemplo, se o demitido resolver desandar a falar (improvável), outras fitas aparecerem (incerto) ou provas documentais surgirem (intangível). No final, o óbvio. Um governo mais fraco, com cicatrizes, segue em frente.
Esse processo consume semanas ou meses. Depende dos fatores imponderáveis já citados. FHC protagonizou os casos Sivam, compra de votos da reeleição, Telebrás. Lula está começando. Também haverá turbulências na economia. O tucano teve as crises de Rússia, México e Ásia. O petista enfrentará a inexorável alta da taxa de juros dos EUA -cedo ou tarde.
Esse ciclo político padronizado dá aos presidentes brasileiros só um ano de muita força, o primeiro, ao assumirem o cargo. Fazem o que querem. FHC quebrou os monopólios estatais. Lula reformou a Previdência. Depois, administram crises. Uma alternativa a esse calendário perverso é a saída para o Brasil. Nenhum político chegou perto disso, Lula incluso.


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