São Paulo, terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Enfrentamento ao tráfico de pessoas

ROMEU TUMA JÚNIOR


Todos devem informar-se sobre a origem dos produtos e verificar se não foram produzidos por meio da exploração de trabalhadores

RECENTEMENTE , o Brasil participou, em Viena, da segunda reunião do Grupo de Trabalho sobre Tráfico de Pessoas, da Convenção da ONU contra o Crime Organizado Transnacional e seus protocolos.
Após dez anos da implementação do protocolo adicional à Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional Relativo à Prevenção e Punição do Tráfico de Pessoas, em especial mulheres e crianças (Protocolo de Palermo), os países discutiram qual a melhor forma de avaliar o cumprimento do que foi estabelecido e a efetividade da implementação de suas recomendações.
A delegação brasileira presente à reunião do grupo pôde perceber o quanto o Brasil avançou em termos de políticas públicas voltadas ao enfrentamento do tráfico de pessoas, entendendo esse enfrentamento como um conjunto de medidas que visam prevenir e reprimir esse tipo de crime, assim como o atendimento às vítimas.
Enquanto alguns países discutiam a necessidade de implementar planos nacionais e até mesmo a elaboração de campanhas, o Brasil concluiu, no dia 8 de janeiro deste ano, o seu primeiro plano, estabelecendo como meta o segundo, tendo por base a Política Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas, instituída por meio do decreto nº 5.948, de 26 de outubro de 2006.
Nessa mesma perspectiva, o Brasil reforçou o enfrentamento ao tráfico de pessoas por meio do Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci), que vem obtendo resultados na redução da violência, tendo por uma de suas metas o combate a esse crime. No dia 9 de fevereiro, houve o lançamento da Campanha Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas. Com o objetivo de conscientizar e alertar a população sobre esse tema, a campanha será realizada no Rio de Janeiro e em mais nove cidades do país (Recife, São Paulo, Goiânia, Salvador, Fortaleza, Porto Alegre, Belo Horizonte, Brasília e Belém).
No que refere ao uso da tecnologia, enquanto a Organização das Nações Unidas discutia a criação de um instrumento para acompanhar a implementação do protocolo, o Brasil mais uma vez mostrou o quanto avançou na luta contra esse crime.
Neste mês, a Secretaria Nacional de Justiça (SNJ) iniciou os testes do Sistema Integrado de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas, que possibilitará o compartilhamento de informações no que se refere à execução de planos nacionais.
Outro objetivo é a integração dos sistemas de informações na área de tráfico de pessoas entre os órgãos de Justiça e segurança pública, possibilitando a troca de dados no decorrer das investigações.
Nos encontros nacionais e internacionais de que a SNJ tem participado sobre o tema, enfatizamos que o tráfico de pessoas não é um problema somente dos países de origem das vítimas, devendo os países de trânsito e destino coibir, especialmente, o consumo de produtos da exploração da mão de obra das vítimas, que, nesse caso, vivem em condições análogas às de escravos.
Portanto, os cidadãos de todos os países devem informar-se sobre a origem dos produtos que adquirem e verificar, por exemplo, se não foram produzidos por meio da exploração de trabalhadores. Ainda é válido salientar que o crime em questão está relacionado com a migração irregular, de forma que precisamos cuidar também dos imigrantes.
Nesse sentido, o Brasil aprovou o projeto de lei que anistia pessoas em situação irregular e está em fase de análise o projeto da nova lei de estrangeiros, que permitirá a concessão do visto de residência temporária a pessoas traficadas, mostrando o quanto é importante os países não endurecerem as leis contra os imigrantes nessa situação.
Ou seja, é preciso, sim, fazer um trabalho mais humanizado no seu acolhimento, uma vez que se trata de pessoas que procuram apenas melhores condições de vida. Porém, devido à própria circunstância de irregularidade e consequente falta de documentos, transformam-se em candidatos a vítimas do tráfico para fins de exploração nas mais diversas formas e manifestações.
Somos conscientes de que só com muito trabalho e, acima de tudo, muita dedicação para com os cidadãos, sejam eles brasileiros ou não, é que iremos avançar no combate a um crime tão cruel como é o tráfico de pessoas.
Mas, como tenho afirmado, o tráfico de pessoas será efetivamente apagado da história do Brasil e do mundo quando cada um tiver a consciência da importância do seu papel, enquanto cidadão(ã) no enfrentamento a essa brutal violação à dignidade do ser humano.
Por fim, reafirmo que "gente vender gente" é coisa do passado, não se pode admitir essa prática em pleno século 21.


ROMEU TUMA JÚNIOR , delegado da Polícia Civil, é secretário nacional de Justiça e responsável pelo Departamento de Tráfico de Pessoas do Ministério da Justiça.

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