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FERNANDO RODRIGUES
Padrões de perfeição
BRASÍLIA - A Folha aqui em Brasília está em frente a um edifício
chamado "Venâncio 3000". O prédio é horrível. Em três blocos, assemelha-se a grandes caixas de sapatos alinhadas. Do lado de fora, uma
reforma de quase meia década tenta dar uma maquiada no lugar. Outro dia choveu. As entradas do estacionamento ficaram alagadas. Alguém esqueceu de fazer um bueiro
para as águas pluviais.
O Venâncio 3000 é mais ou menos como o Brasil: está melhor do
que antes da reforma, mas há uma
sensação de trabalho malfeito combinado com falta de planejamento.
Cedo ou tarde a maquiagem se vai e
teremos problemas sérios.
Não é esse o entendimento do
presidente Luiz Inácio Lula da Silva
sobre o país. Na sua entrevista coletiva ontem, o petista ontem só faltou colocar o Brasil à frente da Suécia ou de outro país estável do Primeiro Mundo. Não só o Brasil. Lula
também se acha em excelente estado. Uma de suas frases: "Eu já estou
atingindo a minha perfeição".
É um padrão curioso de perfeição. Lula parece confundir situação
melhor com excelência. Beneficiou-se de uma fórmula engenhosa
e eficaz: o crescimento medíocre
conjugado à inflação baixa (para padrões brasileiros). Reeleito, passou
a acreditar ter encontrado uma espécie de "santo graal" para a administração do país.
Nunca a expressão "conceder
uma entrevista" foi tão verdadeira.
Ontem, era o comandante supremo
fazendo uma concessão -não um
homem público cumprindo o dever
de prestar contas. As réplicas dos
jornalistas eram inúteis. A respostas vinham, em regra, desprovidas
de objetividade.
Mesmo talvez detestando a maioria dos presentes, Lula sorria para
os perguntadores. Buscava uma
cumplicidade cordial.
Emulou à perfeição -aí, sim- o
estilo dissimulado descrito por Sérgio Buarque de Holanda em "Raízes
do Brasil".
frodriguesbsb@uol.com.br
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